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Artista remete a um mundo operário
da Reportagem Local
Saint Clair Cemin falou à Folha
sobre a relação da pintura e dos
objetos do dia-a-dia e sobre a
apropriação de outros signos artísticos.
Folha - A referência explícita a
objetos de uso cotidiano é uma
forma de atingir mais diretamente
seu espectador?
Saint Clair Cemin - Acho que incidentalmente é uma forma de
atingir mais diretamente meu espectador. Mas acho que a origem
dessa minha preocupação com objetos cotidianos não vem dessa necessidade, se bem que ela chegue a
isso. Ela vem mais de uma pesquisa inicial de meu trabalho, quando
cheguei à conclusão de que nos últimos séculos o paradigma da escultura era muito mais a pintura.
Mas a experiência humana de fazer objetos é uma experiência muito mais vasta e tem mais a ver com
objetos de uso, com ferramentas.
Então procurei dirigir o meu trabalho nessa direção. O nosso mundo todo é tridimensional, e o paradigma para esse mundo tridimensional não é a pintura, mas o uso.
Então procurei fazer objetos que
surgissem desse mundo de uso,
mais do que do mundo de representação visual, como a pintura e a
escultura tradicional.
Folha - Por que a referência a um
universo operário e agrário?
Cemin - Essa é uma parte do Brasil que me é muito próxima. Minha
família é de origem rural. Os primeiros anos de minha infância foram passados no campo. Esses objetos sempre me impressionaram.
Tem uma escultura que parece
uma enxada. Quando eu era menininho, uma enxada era quase do
meu tamanho. Estou me referindo
a objetos que eram míticos para
mim, estranhos...
Folha - O fato de suas peças trazerem sempre signos de um artesanato, de um universo popular,
não fez com que sua obra tivesse
uma leitura errônea?
Cemin - Provavelmente, mas
não é ``errônea''. São leituras corretas, embora contrárias às minhas idéias. Eu acho que trabalhar
a matéria é uma forma de inteligência importante e que é rejeitada
por causa de um elitismo e de uma
certa tendência a entender o trabalho manual como uma coisa inferior. Isso é um absurdo.
Folha - Essa apropriação de signos artísticos, como a máscara de
teatro greco-romana, os profetas
de Aleijadinho, flertes com a arte
conceitual, faz parte de uma característica pós-moderna de sua produção, de reutilização de elementos artísticos?
Cemin - Existe uma diferença
fundamental entre o que eu estou
fazendo e a noção de pós-modrnismo. O pós-modernismo utiliza
elementos do passado de uma forma, eu diria, fria, paródica, distante. É como uma linguagem, como
ir ao supermercado, comprar uma
série de coisas, voltar para casa e
fazer uma composição.
Quando eu utilizo elementos do
passado, aliás, todos os elementos
que uso são do passado, que pode
ser muito distante ou muito recente. Esses elementos não são cópias
ou utilizados friamente. Não copio
nada, reinvento tudo. Qualquer
coisa que eu utilize e possa lembrar
o barroco, o grego, arte africana
ou art nouveau, são elementos filtrados pelo meu inconsciente.
Folha - Existe humor em seu trabalho?
Cemin - Não tenho intenção direta de fazer humor, mas ele acontece espontaneamente. Muitas vezes eu faço justaposições de coisas
que podem ser vistas de várias maneiras diferentes, acabam conduzindo a um certo tipo de humor,
mas é mais um resultado que uma
intenção.
Folha - Você sente saudades de
algo antigo?
Cemin - Meu trabalho é só isso. É
só saudade.
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