São Paulo, Segunda-feira, 05 de Abril de 1999 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VÍDEO - LANÇAMENTOS Cinema globalizado
HECTOR BABENCO JOÃO LEIVA FILHO Editor-adjunto de Especiais Em "Coração Iluminado", obra assumidamente autobiográfica, o argentino Hector Babenco escancara sua concepção de cinema. "Saber contar uma história" e "ver somente o que interessa ver", diz um personagem. Essa idéia, ao mesmo tempo vaga e precisa, ajuda a revelar os méritos e problemas do filme. Na Mar del Plata dos anos 60, Juan, jovem judeu sonhador, vive o preconceito e a dificuldade financeira de seu pai na companhia de esotéricos caçadores de aura e de Ana, moça desequilibrada por quem ele se apaixona. Essa é a tônica dos 90 minutos iniciais do filme, que então sofre um corte abrupto. Nos cerca de 35 minutos finais, vemos Juan, agora um cineasta, voltar à Argentina 20 anos depois, para acompanhar a morte do pai. Melancólico, ele procura por seu amor de juventude, que acaba encontrando em outra mulher instável como Ana. Babenco atinge o equilíbrio em termos de imagem. Vai direto ao "que interessa ver". Utiliza uma ampla gama de recursos (planos longos, curtos, abertos, fechados, angulações variadas e tomadas em movimento) sem ansiedade, sem exageros, fazendo com que eles participem efetivamente da construção da atmosfera do filme. Quanto à narrativa, o próprio diretor definiu, em entrevista à Folha em 98, sua estratégia: "A informação que geralmente é verbalizada a gente procurou ocultar (...) O importante era dizer sem ter que dizer". E é de forma contrastada que a história surge. Imagens e montagem claras e diretas, no melhor padrão clássico, retratam situações inusitadas, vagas, que desafiam sua roupagem tradicional. Mas a estratégia é corroída pelo desequilíbrio entre Juan e Ana. A atriz Maria Luisa Mendonça, com ótima atuação, superior à de Walter Quiroz, rouba o filme e reduz o peso de Juan. Além disso, o roteiro banca uma aposta perigosa, onde o "dizer sem dizer" vale mais para Juan. Ana conduz e dá o tom às cenas do casal. Fala e expõe seus sentimentos, enquanto Juan, tímido, aparece boquiaberto diante dela. O próprio diretor se incomodou com uma crítica decorrente dessa opção: "Não entendo as pessoas não acreditarem na paixão entre os personagens. Ele rompe com tudo para fugir com ela". Sem dúvida isso está dito. Mas será que é visto? Caso fosse, não haveria a sensação de fragilidade na relação da dupla. Se o problema está no roteiro ou no ator, é algo discutível, mas o fato é que o que "interessa ver" se perde nesse descompasso. E o desequilíbrio cresce na segunda parte. Com duração de um terço da primeira, seu peso tende a ser menor. Como o filme não compensa a "desvantagem", o acerto de contas com o passado fica fragilizado. Os novos atores, os diálogos e as situações perdem força. Ana (Maria Luisa) faz muita falta. As críticas, porém, poderiam ser rebatidas por outra frase do diretor: "É um filme que apostou na inversão total do léxico narrativo". O problema é que a inversão não foi alinhavada com equilíbrio. E deixou expostas as fraquezas do filme. Filme: Coração Iluminado Produção: Brasil, Argentina e França, 1998, 132 minutos Direção: Hector Babenco Com: Walter Quiroz, Maria Luisa Mendonça, Miguel Angel Solá e Xuxa Lopes Texto Anterior: Outros lançamentos Próximo Texto: Manuel Poirier Índice |
|