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CRÍTICA
Gerson King Combo tem tino e coerência
DA REPORTAGEM LOCAL
Houvesse nascido nos Estados Unidos, Gerson King
Combo seria um pioneiro do rock
feito Little Richard ou Chuck
Berry, coberto de glória, aposentado, sumido e entupido de grana.
Aqui a sina é diferente, não só
pelo subdesenvolvimento geral
da nação como também porque
ele foi um dos artistas que bateram pé em ser simplesmente
americanizados, sem aderir aos
cliques geniais de Jorge Ben e Tim
Maia, que casaram blues e samba
e funk e baião e soul e MPB.
"Mensageiro da Paz" traz de
volta, tão tardiamente, aquela
maneira peituda de ser. O funk é
funk mesmo, sem caprichos de
samba, muito menos do "funk"
alienígena carioca.
Rende desde regravações ok das
antiguidades até a pequena catarse moderninha de "Tudo É Possível" e o funk agora calmo e maduro da faixa-título, dividida com
vocais inteiraços de Sandra de Sá,
outra desgarrada do movimento
black Brasil.
Os esboços de reagregação da
nação black da MPB por Gerson
provam-se frutíferos, e a participação da quase sempre perdida
Cidade Negra, na militante "Força
e Poder", resulta em outro dos belos momentos do CD.
Os grooves de soul e funk orientam também a postura política
pelo igualitarismo de Gerson. Se
em 77 ela era ainda medrosa, algo
subserviente ("os blacks não querem ofender a ninguém", cantava
"Mandamentos Black", meio se
desculpando pelo "atrevimento"
de pedir espaço), na divertida
"Desce Daí" King Combo solta todos os bichos.
Passa pito em surfistas de trem e
torcidas violentas, chama skinhead de "nazista bundão", acha
que pitboys e carecas têm "mais é
que dar o... não sei o quê" e cria o
funk simpatizante, achando que
"quem gosta de comer, come,
quem gosta de dar, dá, e tá tudo
certo". Uma resposta velada a
"Vale Tudo", de Tim Maia?
Sim ou não, fato é que a sombra
de Tim assusta um pouco "Mensageiro da Paz". O lado baladão,
hipertrofiado aqui, torna inevitáveis as comparações, e fica evidente que a voz de Gerson não
tem, nem de longe, o alcance da
do herói morto.
Seja como for, no balanço Gerson King Combo faz sua reestréia
de queixo erguido. Não tem o status, o volume de obra e a conta
bancária de James Brown ou
George Clinton, mas dignidade,
tino e coerência não se contam
em dólar, mesmo.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Mensageiro da Paz
Artista: Gerson King Combo
Lançamento: Continental
Quanto: R$ 25, em média
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