|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"HISTÓRIA DO BRASIL PELO MÉTODO CONFUSO"
Obra coloca país em palco tropical de humor e ironia
GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Este livro, agora reeditado em
hora oportuna, teve na década de 20 relativo sucesso, depois
passou em brancas nuvens no
mais completo ostracismo. Esquecido. Cemitério das letras.
Há muito tempo ninguém o lê,
nenhum historiador de peso, nacional ou estrangeiro, parece citá-lo, e talvez tenha ficado um tanto
quanto caduco por causa de seu
procedimento metodológico de
contar a história do povo brasileiro de modo escalafobético na busca fácil do humor e da ironia.
"Corria o ano de 1500, de nosso
Senhor Jesus Cristo, quando a
United Press lançou em Portugal
a notícia maravilhosa da extinção
do comissariado Brasil."
É preciso ter em mira que método significa caminho e que o passado ainda nem é sequer passado,
como dizia William Faulkner. A
comédia da tirada engraçadinha é
a linguagem dos partidos políticos conservadores de direita. "D.
João Cesto no Brasil."
A história do Brasil passa a ser
apresentada em uma narrativa de
teatro "nonsense", como sendo o
palco tropical do ridículo e do
pândego. "A abolição não foi pois
a emancipação dos pretos, mas
simplesmente a emancipação das
pretas."
O que há de sério e calculado na
exploração colonial deixa-se de
lado. O leitor fica sem saber se o
problema é do historiador ou da
história. Afinal, nossa história é
moldada pelo latifúndio exportador. Curiosamente, a pobreza
aparece sempre na narrativa da
caridade católica. É a pobreza sem
vínculo algum com o conceito de
exploração.
A pesquisadora Isabel Lustosa
informa no prefácio que o autor,
José Madeira de Freitas, capixaba,
valendo-se do pseudônimo Mendes Fradique, tirado de Eça de
Queiroz, formou-se em medicina
no Rio de Janeiro e foi amigo do
poeta Emílio Menezes. Colaborou
fazendo caricatura no jornal "O
Pirralho", de Oswald de Andrade,
no início da década de 10.
Embora não gostasse do modernismo de 22, o que desperta
curiosidade em sua prosa vem
desse berço estético, a exemplo da
brincadeira fônica com a língua,
as paródias, os trocadilhos e os jogos de palavras. "Os tupis, os tapuias, os parvenus", ou senão este: "Um pici kólogo". Mexendo
no dicionário: "Jurisprudência
-muitos júris e pouquíssima
prudência". É complicado tratar a
matéria da história do Brasil como fonte de humor ligeiro. Estamos disso cientes porque na cultura brasileira existe uma total hegemonia humorística: o que não
faz rir não presta. As maiores
atrocidades são anunciadas pelo
riso na TV. Tudo tende ao risível.
Esquecemos que Machado de Assis nunca riu.
Em 1920 quando escreveu esse
livro, o autor não era ainda integralista. Filiou-se ao integralismo
em 1932. Acabou sendo preso durante o Estado Novo ao participar
em 1938 do levante armado integralista contra Getúlio Vargas no
Palácio do Catete.
É bem provável que a admiração por Plínio Salgado já estivesse
em seu método confuso, superficial, sacana e enfadonho de escrever a história do Brasil. "A gente
do Pindorama guiava-se pelo
mesmo princípio político que
ainda hoje nos rege: todo mundo
manda e ninguém obedece." Isso
para dizer que a "autoridade absoluta" era exercida pelo pajé, ao
qual compara de maneira equivocada com Antônio Conselheiro de
Canudos.
Gilberto Felisberto Vasconcellos é
professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "A Salvação da Lavoura" (ed. Casa
Amarela).
História do Brasil pelo Método Confuso
Autor: Mendes Fradique
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 35,50 (298 págs.)
Texto Anterior: "Divina comédia da fama": Livro descreve a trajetória do candidato a famoso Próximo Texto: Livro/lançamento: Falcão define o que é vanguarda política Índice
|