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DOCUMENTÁRIO
Fã de Ken Loach, cineasta brasileiro faz longa para "corrigir" "Pão e Rosas"
Admiração do avesso
DA REPORTAGEM LOCAL
"Sem nenhuma pretensão", o diretor brasileiro Henrique Goldman, 40, procurou corrigir o cineasta britânico Ken Loach, 66. Sendo o cinema o território de
ambos, é natural que o debate se desse na tela.
Os argumentos de Goldman estão expostos no documentário
"Ken e Rosa", que o Cinemax leva
ao ar esta noite no Brasil. Ou melhor, eles são o próprio filme.
A Rosa que protagoniza o título
é figurante no longa de ficção
"Pão e Rosas", lançado por Loach
em 2000 e que aborda a luta por
melhores salários e condições de
trabalho de uma comunidade latina de funcionários de limpeza
em Los Angeles (EUA).
No filme do britânico, a personagem central é a imigrante mexicana Maya, interpretada pela atriz
Pilar Padilla. Ao dar o "papel
principal" de seu documentário
para a faxineira salvadorenha Rosa Ayalla, Goldman quis reparar
um equívoco que considera recorrente no cinema de Loach e
também uma injustiça específica.
Latinos x gringos
"Adoro o que ele faz, sou fã e me
sinto influenciado por seus filmes,
mas acho que, quando Loach trata da América Latina, não sabe do
que está falando", diz o brasileiro,
que morou quatro anos nos Estados Unidos e hoje tem residência
fixa em Londres.
"Acho que o herói de "Pão e Rosas" é um americano politizado,
que está ensinando a revolução
para gente mil vezes superior a ele
nesse assunto. Mexicanos e salvadorenhos entendem a revolução,
historicamente, muito antes que
os americanos. Eles não precisam
de um heroizinho gringo para
lhes dar lições. Isso não vale para
o Brasil, onde a gente não entende
de revolução, entende de Copa do
Mundo", diz Goldman.
Quando cita o "heroizinho", o
diretor se refere ao personagem
Sam Shapiro (Adrien Brody), um
organizador da luta sindical dos
trabalhadores latinos.
"Ken e Rosa" acompanha as filmagens do longa de Loach, entrevista atores, técnicos e, é claro, o
diretor. Para melhor traçar a biografia de Rosa Ayalla, o cineasta
brasileiro e um assistente levam-na até El Salvador, onde vive a família que a faxineira ajuda a sustentar com o que recebe limpando escritórios em Los Angeles.
Financiado pela TV inglesa
Channel Four, o filme seria, originalmente, um "making of" de
"Pão e Rosas". O projeto rumou
em direção à vida de Ayalla quando Goldman achou que "entre todos os envolvidos nas filmagens, ela era a pessoa mais fascinante".
Etiópia
O cineasta brasileiro diz ter a
impressão de que Loach não gostou de seu filme, assim como o inverso também se deu. "Não gostaria de falar sobre isso, porque não
quero ser impreciso. Mas me parece que ele acha que manipulei
muito", diz.
Para que não haja dúvida sobre
a admiração que (só) às vezes
pende ao seu contrário, Goldman
afirma: "Ken é uma das vozes
mais interessantes, não só no cinema como no panorama político inglês. É um revolucionário no
cinema e na política, mesmo que
hoje essa palavra soe "démodé'".
Atualmente Goldman trabalha
no roteiro de um filme de ficção a
ser rodado na Etiópia, em torno
da história de dois missionários
que decidem trabalhar no país.
"Adoro "outsiders'", diz.
O longa anterior de Goldman,
"Princesa", de 2001, baseado na
história real de um travesti brasileiro na Itália -também relatada
em livro- foi exibido no Brasil
em mostras e poderá entrar em
cartaz no circuito comercial ainda
este ano. "Estamos negociando o
lançamento."
Comentando o filme de Loach,
a salvadorenha Rosa Ayalla diz,
para a câmera do brasileiro: "Eu
me identifico tanto com esse filme
que, por mim, ele poderia se chamar "Pão e Rosa'". Ao espectador,
a chance de despetalar ambas as histórias.
(SILVANA ARANTES)
KEN E ROSA - Direção: Henrique
Goldman (EUA, 2001). Com Rosa Ayalla, Ken Loach e outros. Hoje, às 22h, no
canal Cinemax (TV paga).
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