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"Ride with the Devil" revela falta de criatividade de Ang Lee
LÚCIA NAGIB
enviada especial a Londres
"Ride with the Devil", filme de
Ang Lee que abriu o Festival de
Cinema de Londres, não consegue deixar mais do que uma interrogação no espectador.
Há muito o diretor taiwanês,
emigrado para os Estados Unidos, optou pelo ecletismo, balançando entre a terra natal e a pátria
adotiva. Sua proposta, como a de
outros diretores estrangeiros na
América, é imprimir a marca autoral no cinema hollywoodiano
-tarefa difícil, capaz de arruinar
a carreira dos que não têm o fôlego de um Fritz Lang.
"Ride with the Devil", filme voltado para o principal problema
histórico dos Estados Unidos, a
Guerra Civil de meados do século
19, em vez de nos mostrar Lee
conquistando um novo terreno,
revela um diretor acuado, incapaz
de exercer sua criatividade.
Já a escolha do tema parece ousadia excessiva. Não apenas porque o assunto consta da agenda
americana desde Griffith, mas
porque o roteiro se baseia num
romance polêmico de Daniel
Woodrell, destinado a resgatar os
jovens guerrilheiros sulistas, os
"bushwhakers", lutadores ingênuos, mas sanguinários, que
mantiveram seus violentos ataques mesmo depois da vitória dos
"unionists" do Norte.
Jake Roedel, interpretado por
Tobey Maguire, de "Tempestade
de Gelo", é o duvidoso herói da
história. Filho de um imigrante
alemão, alinhado com os democratas, abandona o lar para guerrilhar do lado oposto ao do pai,
contra um inimigo que ele não
conhece direito. A causa escravocrata e separatista não passa de
longínquas alusões ao longo dos
140 minutos de filme, largamente
preenchidos por tiroteios.
Carente de elementos históricos, a trama se concentra em destinos individuais nem sempre interessantes. Na tediosa convivência entre os homens entocados no
meio do mato, aparece uma jovem viúva, como que caída do
céu, que lhes oferece alimento. É
claro que pelo menos dois guerrilheiros se apaixonam por ela.
O heroísmo de Jake se resume
ao fato de ele duvidar da eficácia
das carnificinas que pratica, ao
passo que seu amigo, Pitt (o belo
Jonathan Rhys Meyers), se entrega a elas de coração.
Lee e seu roteirista de sempre,
James Schamus, quiseram pintar
o retrato comovente de meninos
arrancados do conforto familiar,
que não conhecem nada do mundo além do sangue, da mutilação
e da morte. Mas esqueceram de
explicar que a Guerra Civil não foi
provocada por ingênuos vaqueiros, mas por racistas convictos.
Lee acabou fazendo um filme
tendencioso, arrematado por
uma música enjoativa e convencional, de injustificáveis inflexões
patrióticas. O diretor alega que,
enquanto estrangeiro colonizado
pelo ideal americano, se identificou com os meninos sulistas dominados pelos yankees. Quem sabe num filme posterior esclareça
melhor o que quis dizer com isso.
Avaliação:
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