São Paulo, terça-feira, 05 de novembro de 2002

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26ª MOSTRA DE CINEMA DE SP

Personagens de "Ken Park" nasceram antes da estréia do cineasta na direção, com "Kids" (95)

"Há um preço a pagar pela violência", diz Larry Clark

DA REDAÇÃO

Leia a seguir trechos da entrevista com o diretor norte-americano Larry Clark sobre "Ken Park". (LÚCIA VALENTIM RODRIGUES)
 

Folha - "Ken Park" foi o primeiro filme que você quis fazer. Por que demorou tanto para sair?
Larry Clark -
O projeto é de 95. Mas, por ser uma idéia diferente do que dita as regras de Hollywood, ficou na gaveta por muito tempo. As produtoras me diziam que era polêmico demais, provocativo demais. Demorou para eu conseguir arrecadar o dinheiro.

Folha - Por que fazer um filme com sexo e violência explícitos?
Clark -
Porque essa é a realidade. O que Hollywood mostra é entretenimento barato. Em "Ken Park" tudo é verdadeiro: ou de conhecidos meus ou do que li no jornal.

Folha - E por que outros diretores não mostram essa realidade?
Clark -
Vejo as coisas por outro ângulo, talvez por ser fotógrafo. Ou talvez os cineastas só queiram ganhar dinheiro. Em Hollywood, os finais são trocados se a platéia-teste não gostar. Isso não é jeito de fazer cinema, isso é como um hambúrguer do McDonald's: após meia hora, ninguém mais lembra o que viu. Não cortaria "Ken Park" para uma versão leve.

Folha - "Ken Park" explicita mais a sexualidade que "Kids"...
Clark -
É, mas, por outro lado, hoje os jovens estão fazendo mais sexo. Do jeito que os EUA e a sociedade americana estão configurados, é dito aos adolescentes para transarem mais cedo. Não sei ao certo se isso é positivo, porque nem todos estão prontos para fazer sexo. Mas tento ser flexível.

Folha - Quantos filhos você tem?
Clark -
Matt tem 19 e escolheu as músicas de "Ken Park" -o rap e o hip hop, principalmente. A mais velha tem 27 e acabou de ter um menino, ou seja, virei avô -é engraçado, ainda não me acostumei à idéia. E tenho outra garota de 16.

Folha - Você pede a eles para darem palpites em seus filmes?
Clark -
Minha filha ainda é jovem, mas meu filho viu todos os meus filmes antes de serem lançados. Ela era muito criança para ver "Kids" na época de lançamento, mas já assistiu há alguns anos.

Folha - E ela já viu "Ken Park"?
Clark -
Er... Não, ainda não.

Folha - Mas você permitiria que ela visse "Ken Park"?
Clark -
Hum... Quer dizer... Não sei... Claro, ela pode ver.

Folha - Você é um pai conservador para garotas?
Clark -
Mais ou menos. Meus filhos são bem sofisticados, já viram de tudo, ainda mais vivendo no meio artístico nova-iorquino.

Folha - Você acha que seu jeito de filmar banaliza violência e drogas?
Clark -
Vivemos num mundo violento. Em "Ken Park" só há um tiro e duas facadas. O motivo pelo qual parece violento é o contraste desse ambiente ao de filmes em que há centenas de mortes, sangue, tiros, mas o público não liga. Meu realismo não deixa a platéia sair ilesa. Tem de perceber que há um preço a pagar, que não é uma brincadeira estúpida.

Folha - Qual seu novo projeto?
Clark -
Estou captando recursos para um filme baseado numa história infantil adaptada para os tempos modernos. Achei que seria algo diferente. Tenho ainda dois roteiros na mão, devo estar filmando nos próximos meses. Mas é difícil arrecadar dinheiro. Parece que "Kids" dificultou as coisas. E talvez fique ainda mais difícil após "Ken Park". Os produtores gostam dos meus filmes, mas sempre ficam relutantes quanto a novos projetos. Mas nunca vou desistir de lutar, de tentar filmar à minha maneira.


KEN PARK - Direção: Larry Clark e Ed Lachman. Quando: hoje, às 19h40, no Cineclube DirecTV 1



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