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MULTIMÍDIA "THE NEW YORK TIMES"
Aleijadinho criou "versão mulata" do barroco
da Redação
O jornal "The New York Times", em recente texto intitulado
"Aleijadinho: Um mestre brasileiro que floresceu nas cidades do
ouro", constata que o artista mineiro que trabalhou até a morte,
amarrando seus instrumentos
aos pulsos, merece ser reconhecido internacionalmente.
Aleijadinho, filho de uma escrava com um português, criou uma
versão própria do barroco, diferenciada daquela desenvolvida na
América espanhola -onde houve o contato com artesãos indígenas.
A exposição "Brasil Barroco
-Entre o Céu e a Terra", a mais
completa sobre o barroco brasileiro, ainda pode ser vista até o dia
6 de fevereiro, no Museu de Belas
Artes da Cidade de Paris, o Petit
Palais.
ALAN RIDING
do "The New York Times", em Paris
Até perto de seus 40 anos, Antônio Francisco Lisboa era um arquiteto e escultor bem-sucedido
que desfrutava dos tempos felizes
trazidos pela corrida do ouro no
Estado brasileiro de Minas Gerais, no século 18.
Mas, por volta de 1777, ele contraiu uma misteriosa doença que
forçou a amputação de seus dedos e das extremidades inferiores
de suas pernas. A enfermidade
valeu-lhe o apelido "Aleijadinho", mas ele continuou trabalhando, amarrando os instrumentos aos pulsos, até poucos
anos antes de morrer, em 1814.
Hoje, é como Aleijadinho que
Lisboa é celebrado, na posição de
um dos mais importantes escultores do Novo Mundo. Suas estátuas de madeira e pedra de figuras religiosas representam o ponto alto da arte barroca nas Américas. Em parte, a razão de não ser
mais conhecido fora do Brasil é
porque seus trabalhos mais famosos estão em igrejas de Ouro
Preto, Congonhas do Campo, São
João del Rei e outras cidades coloniais de Minas Gerais. (...)
"Barroco Brasileiro - Entre o
Céu e a Terra", (...) está dando aos
parisienses a chance de descobrir
não só cerca de duas dúzias de
obras de Aleijadinho, mas também outros tesouros do movimento barroco, que deu forma à
arte e à arquitetura brasileira do
começo do século 17 ao começo
do 19. (...)
Há um motivo especial para
que a exposição se realize em Paris. Em 1945, Germain Bazin, curador de pinturas do Louvre, viajou ao Rio de Janeiro, onde descobriu o barroco brasileiro (...).
Assim, a exposição é também
uma homenagem a Bazin, que
morreu em 1990.
Ainda assim, não é surpreendente que os historiadores de arte
europeus e norte-americanos tenham pouca familiaridade com o
movimento barroco, que varreu
não só o Brasil mas também o
México, o Peru, o Equador e a Bolívia. Espanha e Portugal (...) demonstraram pouco interesse pela
arte de suas colônias latino-americanas, da mesma forma que os
protestantes do norte da Europa e
dos Estados Unidos não se sentiam atraídos pela iconografia católica. Por isso, na melhor das hipóteses, o movimento era considerado uma imitação dos estilos
do sul da Europa.
No entanto, o barroco latino-americano era diferente. Surgiu
inicialmente no México, no Peru,
no Equador e na Bolívia não só
porque a Espanha encontrou ouro e prata lá para financiar a construção de igrejas, mas também
porque os povos pré-colombianos desses países já eram entalhadores e pedreiros experientes,
-basta ver os grandes templos
astecas, maias, incas (...)
Além de fornecer a mão-de-obra, portanto, os artesãos indígenas emprestaram uma visão
própria ao trabalho que faziam,
dando uma qualidade de sincretismo ao novo barroco.
No Brasil, em contraste, os índios eram em larga medida nômades. Como resultado, diferentemente dos espanhóis, os portugueses não encontraram grandes
cidades já instaladas.
(...) Com o tempo, os escravos
africanos e seus descendentes
(Aleijadinho era filho de escrava
com português) provaram-se escultores habilidosos, e assim criaram também uma versão própria
do barroco. (...)
Comparadas às grandes catedrais e igrejas da América espanhola, as primeiras igrejas brasileiras tinham interiores relativamente simples (...). A descoberta
do ouro, porém, fez de Minas Gerais a Florença do barroco brasileiro.
(...) As principais obras de Aleijadinho, que não podem ser
transportadas, estão presentes
em fotografias: as 12 estátuas em
pedra de profetas do Velho Testamento que ficam em frente à igreja de Congonhas do Campo (...)
realizadas entre 1796 e 1806, depois que o artista perdeu as mãos.
(...)
(...) o talento dele fica mais claro
nas esculturas, não só na forma
como ele detalhava as dobras das
roupas e capturava o movimento
das figuras, mas também nas
emoções poderosas e sempre diferentes transmitidas pelos rostos
de suas estátuas. Aleijadinho, ao
que parece, não se via simplesmente como criador de símbolos,
mas sim como criador de pessoas
vivas apanhadas em um drama
transcendental. (...)
Hoje, o barroco volta a ser reconhecido como parte da herança
cultural brasileira, mas, em um
país obcecado pelo futuro, ele talvez seja mais apreciado pelas levas de turistas estrangeiros que
passam de carro pelas grandes cidades coloniais de Minas Gerais.
É apropriado, portanto, que a
mostra aconteça, e seja tão apreciada, em Paris: muitas das peças
em estilo rococó que ela inclui parecem mais confortáveis no rebuscado Petit Palais do que seria
possível nas modernas São Paulo
ou Rio de Janeiro.
Exposição: Brasil Barroco - Entre o Céu e
a Terra
Quando: Até 6 de fevereiro
Onde: Museu de Belas Artes da Cidade
de Paris
Patrocínio: Union Latine, Petit Palais e
Ministério da Cultura
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