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LIVRO/LANÇAMENTO
Obra bilíngue compila 17 mil sobrenomes de judeus e cristãos-novos originários da península Ibérica
Dicionário viaja ao passado dos sefaradis
MÁRVIO DOS ANJOS
DA REDAÇÃO
Os brasileiros ganharam recentemente uma luxuosa ferramenta
para conhecer suas origens. O
"Dicionário Sefaradi de Sobrenomes", compilado por Guilherme
Faiguenboim, Paulo Valadares e
Anna Rosa Campagnano, traça as
rotas que 17 mil sobrenomes de
sefarditas (judeus da península
Ibérica) e judeus cristianizados
percorreram no mundo.
O dicionário bilíngue é fruto de
uma pesquisa que começou em
1995. "No início, calculamos que a
obra reuniria no máximo mil nomes sefaradis. Em 2002, esse número já ultrapassara os 16 mil, isso após termos eliminado cerca
de 25 mil nomes que apresentavam erros ortográficos ou por não
serem realmente sefaradis", afirma Guilherme Faiguenboim, genealogista que cuidou da parte
etimológica, na introdução do dicionário. "De cada três nomes coletados, só restou um ao final."
Faiguenboim contou à Folha,
por telefone, que o trabalho iniciou-se com todos os três fazendo
de tudo um pouco. "Depois, nós
entendemos que o melhor seria
dividir as tarefas. Anna Rosa
[Campagnano] foi encarregada
do levantamento de fontes, o Paulo [Valadares] comprovava a exatidão e a seriedade das fontes e inseria as informações no computador. Depois eu as sistematizava
em forma de dicionário", diz.
O trabalho foi inspirado no
"Dictionary of Jewish Surnames
from the Russian Empire" (Dicionário de Sobrenomes Judeus do
Império Russo), de Alexander
Beider, que pela primeira vez deu
um caráter científico ao estudo,
em 1993. Era dedicado apenas aos
sobrenomes dos chamados ashkenazim, os judeus residentes no
Leste Europeu.
Além disso, outro grande incentivo foi o genuíno interesse de
brasileiros sobre as origens de
seus nomes de família, fato constatado pela Sociedade Genealógica Judaica do Brasil, da qual Faiguenboim é membro fundador.
"Desde sua fundação, em 1994,
a sociedade tem feito pesquisas
publicadas em seu jornal "Gerações/Brasil", e passou a receber
cartas e e-mails de brasileiros
não-judeus sobre suas origens sefaradis", escreve Faiguenboim.
Muitos desses nomes são absurdamente comuns no Brasil, como
Silva, Souza, Cardoso e Oliveira.
Embora alguns, como os derivados de nomes de animais e árvores, não sejam exatamente uma
novidade, é bem possível que o dicionário revele origens desconhecidas a portadores de alguns sobrenomes de cristãos-novos.
Descobertas que podem provocar reações inesperadas, como a
relatada pelo diplomata brasileiro
Márcio Souza no prefácio do dicionário. Conversando sobre a
origem do sobrenome Bentes
-do qual descende- com um
primo de seu pai, Souza ouviu dele que o nome seria de uma família de confederados do sul dos Estados Unidos, que teriam se refugiado no Baixo Amazonas após a
Guerra de Secessão. Após explicar-lhe que a origem era judaica,
Souza conta que o primo levantou-se da mesa. "E rompeu comigo para sempre", conclui.
Apesar disso, Faiguenboim explica que nem todo portador de
sobrenome incluído no dicionário deve se considerar judeu.
"Mas, se a pessoa se reconhece como judia, o nome dele obrigatoriamente estará ali."
Divisão
O "Dicionário Sefaradi de Sobrenomes" se divide em três partes. A primeira é uma introdução
histórica, escrita por Reuven
Faingold, doutor em história pela
Universidade Hebraica de Jerusalém, que explica a trajetória dos
sefaradis da Antiguidade até a expulsão da Península Ibérica. Na
Espanha, a expulsão (e a pena de
morte, em caso de desobediência)
se deu por ordem dos reis católicos Fernando e Isabel, em 1492,
como punição aos costumes judaizantes dos cristãos-novos.
Em Portugal, essa expulsão, que
começou em 1497, se estendeu
por anos e anos e, enquanto não
se concretizava, foi entremeada
por tentativas de catequização e
ataques sangrentos a cidadãos judeus, culminando com uma inquisição instaurada em 1536.
A segunda parte, escrita pelo
historiador Paulo Valadares, trata
da dispersão sefaradi, dos éditos
de expulsão até o século 20. As introduções históricas mostram a
importância dos judeus na cultura e na economia ibéricas. "Eles se
consideravam ibéricos, estavam
lá havia 15 séculos até serem expulsos", afirma Faiguenboim.
A terceira é o dicionário propriamente dito, precedido por
uma explicação sobre a origem
dos nomes. Em cada verbete, pode-se saber onde foram achadas
as primeiras referências à família
e o trajeto do nome pelo mundo e
até personalidades dessa família.
DICIONÁRIO SEFARADI DE
SOBRENOMES. Organização: Guilherme
Faiguenboim, Ana Rosa Campagnano e
Paulo Valadares. Lançamento: Fraiha.
Patrocinador: Sistema Anglo de Ensino.
Quanto: R$ 150 (528 págs.).
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