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Filme é maldade inútil
JOÃO BATISTA NATALI
da Reportagem Local
É uma maldade inútil, uma quase
perfídia, transformar Jacqueline
du Pré (1945-1987) em personagem de mexericos mundanos que
nada subtraem ou acrescentam à
sua memória de instrumentista.
O violoncelo, instrumento que se
exprime com o sopro da alma,
cresceu em suas mãos. A dolorosa
interrupção de sua carreira, aos 27
anos, impediu que ela adquirisse a
estatura de um Pablo Casals ou de
um Mstislav Rostropovich.
Um músico vale pelo som que escreve ou produz. Trair o marido ou
levar o cunhado para a cama são
atributos pertinentes a personalidades de vida privada exposta.
Jacqueline du Pré foi uma mulher excepcionalmente bela. Concertos documentados pela BBC
mostram seus cabelos loiros e escorridos a balançar ao sabor do
fraseado ou dos acordes. Mas não
era essa a imagem internacional
que prevalecia nos anos 60.
A violoncelista britânica, para a
maioria dos que a admiraram, era
mulher de estúdio de gravação. Foi
nessa circunstância que ela nos legou as "Suítes para Violoncelo"
números 1 e 2 de J. S. Bach.
Bem mais que as pessoas -familiares ou não- que frequentaram
sua cama, Jacqueline du Pré precisará ser lembrada por um único
gesto de extrema generosidade. Ela
doou seu Stradivarius Davidoff, de
1712, a Yo-Ho Ma. Que ele continue a respeitar a força mística
transportada pelo instrumento.
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