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CRÍTICA
Carnaval é reunião do Projac e Ilha de Caras
XICO SÁ
CRÍTICO DA FOLHA
A TV Globo cobriu os desfiles
de Carnaval com a mesma
moral cristã que lhe falta, segundo
os mais pudicos, nos teledramas
de rotina. Contradições do sistema, como diziam os bravos comunistas de antanho.
Nessa cruzada, o derière nacional, tão abusado em outros verões, cedeu lugar às siliconadas
comissões de frente - tendência
da era Gisele Bündchen contra a
nossa linda vocação para a "tanajurice" mestiça.
A sóbria narrativa de Cléber
Machado -um anti-Galvão Bueno por excelência- e Maria Beltrão foi menosprezada pela falta
de boas imagens (ou a escolha das
imagens exibidas, sabe-se lá) pela
emissora. O que obrigava a dupla,
que tem informação, ao clássico
enchimento de linguiça, o esporte
mais antigo desse tipo de evento.
Restava falar sobre os famosos.
Visto pela TV, o desfile não tem
um desconhecido nem um banguela sequer. É uma grande aliança entre o Projac e a Ilha de Caras,
com o patrocínio da cervejaria-mãe. Nesse mundo, até os anônimos são célebres, como no livro
de Ignácio Loyola Brandão.
O camarote é o altar-mor do
culto à fama e ao desequilíbrio.
Seja no túmulo do samba, no Rio
ou na "Triste Bahia" de Gregório
de Mattos, onde sentou praça TV
Bandeirantes. Com uns apresentadores viajando no dendê, caso
de Leão, a maior audiência da
emissora no momento, que mal
sabia o batismo dos blocos.
Como o populacho fica fora da
corda das ruas, área privatizada
pela indústria do abadá, restou à
Band uns planões genéricos da
massa. E camarote. Haja camarote. Com direito ainda ao camarote
do poder tropicalista, o Expresso
2.222 do ministro Gil, 16 toneladas de autoridades e xeleléus.
A Rede TV! não quis saber de
arrodeios ou prosopopéias. Se televisão é circo, arriba com a lona,
moçada. A Babilônia do grotesco.
Ressuscitaram até o ET, aquela
criatura que já ajudou o Gugu na
guerra domingueira. O papel do
medonho é levar cascudos e pontapés. O carrasco da vez é um tal
de Dudu, mais insosso e sem graça que sopa de infartado.
O resto da equipe invadia os
barracões das escolas bastidores,
segundo as vinhetas, para mostrar as modelos/atrizes. Chegavam a pegar no tapa-sexo das
mesmas. Também conferiam o
que era original ou dádiva do silicone. Enfim, alguém para mostrar que, mesmo sendo de origem
cristã, o Carnaval, essa farra de
boêmios amadores, ainda se presta a algum tipo de sacanagem.
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