São Paulo, sexta, 6 de março de 1998

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"THE BIG LEBOWSKI"
Coen fazem sua fábula mais desconcertante

AMIR LABAKI
de Nova York

Os irmãos Coen estão de volta às telas americanas -e felizes. Depois da fria recepção em dois festivais (Sundance e Berlim), estréia hoje em Nova York "The Big Lebowski" (O Grande Lebowski). É o mais delirante filme da dupla.
Tudo se passa como se, à contenção absoluta de "Fargo" (1997), fosse preciso responder com a mais irrestrita improvisação. O gélido "Fargo" soava como uma peça de câmera, o quente "Lebowski" desenvolve-se como um autêntico solo jazzístico.
O motor da trama, mais uma vez, é um sequestro que acaba catalisando uma hilária comédia de erros. Desta vez, o cenário é Los Angeles, durante a Guerra do Golfo de 1991. O personagem central chama-se Jeff Lebowski (Jeff Bridges, numa corajosa composição desglamourizada), mas prefere responder pelo apelido "Dude". Ele é o último dos hippies, mas o uniforme é grunge legítimo: camiseta larga sobre bermuda xadrez.
Seu cotidiano pacato de cerveja, baseado e jogos de boliche é quebrado ao ver sua casa invadida por uma gangue que procura um homônimo rico. Dude vai reclamar ao xará de posses e logo acaba envolvido num caso de polícia.
O Lebowski milionário o contrata para pagar o resgate de sua jovem amante. Dude, claro, vai complicar tudo, ajudado por seu companheiro de boliche, Walter (John Goodman), um veterano do Vietnã convertido ao judaísmo pela mulher que o abandonou.
"Lebowski" prossegue esbanjando liberdade narrativa e variedade estilística. Um enredo que parodia os policiais de Raymond Chandler assume roupagem pop e permite inserções musicais à moda Busby Berkeley.
Na mais feérica delas, o líder iraquiano Saddam Hussein apadrinha a aula de boliche que Dude oferece à desvairada filha do milionário (Julianne Moore, de "O Mundo Perdido"). Moore surge simplesmente fantasiada de Valquíria wagneriana.
A galeria de excêntricos tão cara aos Coen ganha outros novos membros. Steve Buscemi ("Fargo") entra mudo e sai calado como um tímido colega de jogo. John Turturro ("Faça a Coisa Certa") irrompe de vez em quando como uma caricatura de homossexual latino que faz do boliche sua razão de viver. As participações especiais incluem ainda Ben Gazzara (um porno-empresário), David Thewlis (um afetado amigo de Moore) e Sam Elliot (o caubói-narrador).
Para compor a mais desconcertante de suas fábulas sobre a América profunda, Ethan e Joel Coen levam ao paroxismo suas duas marcas principais: a câmera malabarística, que chega aqui a assumir o ponto de vista de uma bola de boliche em plena circunvolução, e os diálogos brilhantemente absurdos, ou vice-versa.
Jamais antes foram tão senhores de seu meio e talvez seja essa arrogância do cinema puro que lhes valha agora tamanha resistência. A história os absolverá.



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