São Paulo, Sábado, 06 de Março de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTIGO
Tiazinha vai ser sexóloga

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
especial para a Folha

Na cama com Tiazinha.
Os adolescentes brasileiros, ansiosos de amor, irão perguntar-lhe sobre os problemas do sexo, da morte e da fome. Consultório libidinoso, didático, pornô.
De repente, Tiazinha pega a banana e ensina aos curumins como colocar a camisinha na pacóvia. Simbolicamente, ela é a mulher que detém o pênis permitido ao desejo dos homens, como se fosse o ocaso do complexo de castração feminino. Tiazinha fálica.
Depois que nos entediamos com a retórica da "transparência", palavra que não sai da boca dos nossos políticos, chegou a hora e a vez do culto ao mistério. Sem mistério mingua o tesão.
Tiazinha é máscara. Persona. Hipocrisia de programa de auditório. Camuflagem. Ela tira uma de suas duas calcinhas. Striptease interruptus. A máscara lhe dá segurança para dançar e se livrar da roupa, porém mantida a nudez em suspenso. A câmera pega Tiazinha em contraplongé, sempre de baixo para cima, focalizando os glúteos rebolantes.
Consulto em Belo Horizonte o escritor Jarbas Medeiros, que considero meu guru em assuntos escatológicos, o Rabelais de Minas Gerais.
E Tiazinha? Ele me diz que Tiazinha, esse diminutivo afetivo de professora primária, é no entanto o inconsciente recalcado da Xuxa. O avesso lúbrico da fada loira. A luxúria da bruxa morena. Todavia, o avesso não é o contrário. Uma está dentro da outra no imaginário de auditório. Imagens superpostas. Xuxa e Tiazinha são xifópagas.
Na clivagem cromática que atravessa a cultura brasileira, Xuxa é a loirosa santificada, enquanto Tiazinha funciona como morena camarão: pura carne. Boca aberta. Língua de fora. Chicote em riste. Símile sádica do Ratinho. Ao público macho adulto, Tiazinha é a promessa da felatio com roupão de seda e, ao mesmo tempo, a melindrosa da porrada, o virago que se veste de espartilho, a mulher fatal de feminilidade prepotente e cruel. Esta Cleópatra cabocla depila o corpo do machito que tem volúpia de apanhar. Enfim, a irada Tiazinha é a lídima expressão da libidinal da algolagnia, ou seja, o prazer sexual associado à dor.
Os irmãos Goncourt, no final do século 19, já alertavam: "A maldade no amor, seja física ou moral, é o sinal do fim das sociedades".


Texto Anterior: Televisão - Crítica: MTV Brasil deve dar ao público aquilo que ele não sabe que quer
Próximo Texto: Livros: "Trilogia Suja" é Cuba que Cuba quer esconder
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.