São Paulo, Terça-feira, 06 de Julho de 1999
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"É uma história simples com personagens fortes"

da Reportagem Local

Martin McDonagh, 28, não controla o impulso para a ironia corrosiva nem diante de perguntas prontas. Recebeu as questões, poderia nem responder, mas saiu a atacar Caryl Churchill, idolatrada em círculos londrinos, e a fazer pouco de Shakespeare.
Mas também sabe falar sério. Diz que o seu interesse é mesmo contar histórias e que "A Rainha da Beleza de Leenane" atingiu repercussão global porque "é uma história simples com personagens fortes". Diz ter tantas histórias na cabeça que precisa se concentrar para poder escrever.
Se ironiza alguns, de outro lado McDonagh não teme dar nome às suas influências: o americano David Mamet e o inglês Harold Pinter. Quando surgiu, chegou a dizer que se voltou para a Irlanda, como tema, para parar de fazer cópias de Mamet e Pinter.
Uma descoberta mais recente foi o irlandês JM (John Millington) Synge (1871-1909), de peças com poesia e cenário próximos às de McDonagh. (NS)


Folha - Você conta histórias e parece gostar muito disso. É necessidade de recuperar essa arte quase perdida no teatro?
Martin McDonagh -
Sim. Eu estou sempre muito mais interessado em ser levado para algum lugar, por um escritor, do que em ser lembrado sobre o lugar onde estou.

Folha - Você não nasceu na Irlanda. O que faz um jovem londrino voltar ao país dos pais para escrever suas peças? O que você achou, nas visitas que fez, que o levou a escrever?
McDonagh -
A estranheza do diálogo de tios e amigos e a beleza da paisagem. E eu queria localizar a peça num lugar diferente do meu próprio, para deixar as histórias seguirem até onde não poderiam ir, caso eu as tivesse colocado muito perto de casa.

Folha - O que você teria em comum com autores que deixaram a Irlanda e o tema, como Beckett, Shaw, Wilde?
McDonagh -
Só a genialidade!!!

Folha - Deixar a Irlanda pela Inglaterra ou os EUA é uma obsessão em "A Rainha da Beleza", mas você parece fazer o caminho contrário, com a peça. Você quer, de certa forma, se livrar de Londres, Nova York?
McDonagh -
Não, até porque eu já escrevi uma peça americana e eu vou escrever uma peça sobre Londres. Só aconteceu de eu localizar as minhas peças primeiro na Irlanda.

Folha - Uma atriz do elenco original disse que a pronúncia da sua dramaturgia não é irlandesa, mas toda sua. O que significa isso? Uma outra camada de ironia no texto?
McDonagh -
Eu acho que é a intensificação do modo como certas áreas da Irlanda falam. A linguagem de "A Rainha da Beleza de Leenane" tenta reproduzir isso de um modo poético, então de certa maneira ela é minha. É uma combinação.

Folha - Você já viu montagens da peça traduzida? Você acha possível ela ser interpretada e entendida em português?
McDonagh -
Sim. Eu vi a peça em islandês em Reykjavik e ela funcionou muito bem lá. Eu não acho que haverá qualquer problema na montagem em português, e quero muito assistir. A peça, você sabe, já foi montada em 25 línguas.

Folha - O que fez dela um tamanho sucesso global?
McDonagh -
É uma história simples combinada com personagens muito fortes, e uma mistura de comédia com uma sensibilidade muito sombria.

Folha - Existe algo em comum entre as suas peças e as de autores como Mark Ravenhill e Patrick Marber?
McDonagh -
Não, eu não acho que exista.

Folha - Quem você mencionaria como seus autores favoritos, no passado e presente? Você diria que algum deles o influenciou?
McDonagh -
David Mamet e Harold Pinter, ambos foram uma influência inicial. JM Synge também, num grau menor.

Folha - O que você diria, por exemplo, de Shakespeare? Você tem uma peça favorita?
McDonagh -
Shakespeare contou algumas boas histórias. Eu gosto particularmente de "Titus Andronicus". Qualquer peça em que uma mulher tem as suas mãos cortadas não pode ser ruim!

Folha - E Caryl Churchill? A ironia política das peças dela tiveram impacto em você, como em outros jovens autores?
McDonagh -
Eu nunca vi uma única peça de Caryl Churchil. Eu fujo de peças "políticas" como da praga!


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