São Paulo, quinta-feira, 06 de outubro de 2005

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COMIDA

Parker instiga amor e ódio em Bordeaux

JORGE CARRARA
COLUNISTA DA FOLHA

O "Guide Parker des Vins de Bordeaux 2005" (ed. Solar, 1.254 págs., 37,05 -cerca de R$ 98; www.amazon.fr), do norte-americano Robert Parker Jr., acaba de chegar às prateleiras francesas. A obra pode botar mais pimenta no polêmico relacionamento de Parker com os produtores daquela região gaulesa.
Advogado, Parker, 58, é um autodidata no mundo de Baco. O seu interesse pelo vinho surgiu durante uma viagem que fez à França em 1967 para visitar a então sua namorada (e atual mulher), Pat Etzel, que estudava na Alsácia. Ela o introduziu aos prazeres da gastronomia e da bebida, dando inicio a uma paixão que nunca mais o abandonou. Parker começou a escrever a respeito de vinhos em 1978, quando lançou o "The Wine Advocate", um guia bimensal, independente, sem publicidade nem relacionamentos comerciais com a indústria, dedicado ao consumidor.
Curiosamente, foi precisamente Bordeaux que o catapultou à fama. Quando a maioria dos especialistas da época considerou a colheita de 1982 apenas boa, ele a indicou como uma das melhores do século. "Muitos dos meus colegas provaram vinhos só em Margaux, que não brilhou tanto. Nas outras regiões teriam encontrado vinhos maravilhosos", explicou numa degustação dessa (divina) safra realizada em Nova York.
Impulsionado pelo sucesso, ele abandonou a advocacia em 1984 para mergulhar por completo no vinho. Hoje, "The Wine Advocate" tem cerca de 40 mil assinantes em 37 países, e Parker já publicou uma dezena de livros, tornando-se o crítico de vinhos mais influente do planeta.
Suas notas podem tanto valorizar os goles de uma propriedade, como fazer com que encalhem no estoque, fato terrível em Bordeaux, terra de uma aristocracia vinícola secular, acostumada a ter absoluto controle de tudo -especialmente dos preços. Por isso, a região vive uma relação de amor e ódio com ele.
As últimas rusgas vieram por conta dos "garagistas", minúsculos produtores (de garagem), em geral surgidos do nada, sem tradição, que fazem vinhos concentrados, carregados na madeira e com cara de Novo Mundo, tal como Parker gosta (e pelo qual é criticado), opostos aos de estilo bordelês, mais leves, sutis e elegantes.
Um dos primeiros foi Jean-Luc Thunevin, um empresário de sucesso apaixonado pelo vinho, que, em 1991, lançou seu Valandraud, um tinto "a la Parker", elaborado na comuna de Saint-Emilion, com uvas nascidas num pequeno vinhedo sem nenhuma classificação ou predicado. Elogiados por Parker, é claro, novos rótulos como Valandraud ou La Mondotte conseguiram fama e preços próximos aos dos tradicionais "Château" do lugar. Uma afronta, para alguns, numa terra que venera os produtos do "terroir", saídos de vinhedos considerados por séculos como de estirpe única para vinhos finos.
O guia 2005 deve deixar outro nervo exposto: o Marojallia, um tinto corte de Cabernet Sauvignon e Merlot, elaborado em Margaux. Na sua quarta edição, safra 2003, a jovem criação de garagem (também assinada por Monsieur Thunevin) é para Parker "talvez o segundo vinho da apelação, eclipsado apenas pelo Château Margaux", mas, para ele, já na frente do resto, inclusive do Château Palmer, outro monstro sagrado da região.


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