São Paulo, Segunda-feira, 06 de Dezembro de 1999


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ARTES PLÁSTICAS

Psicanalista lança obra em que proibiu autores de usarem notas de rodapé e citações filosóficas

Livro ataca os "exegetas" das artes

PAULO VIEIRA
especial para a Folha

O pintor francês Edgar Degas (1834-1917) dizia que "arte é vício: você não a esposa legitimamente; você a viola"; O aforista grego Hipócrates (460 a.C. - 357 a.C.) já falava ser a "vida curta" e a "arte longa"; a poetisa americana Sylvia Plath (1932-1963), diz que "morrer é arte, como tudo o mais."
Outras citações também poderiam ser aqui arroladas, usando o expediente daqueles que escrevem catálogos de exposições ou livros sobre artistas plásticos brasileiros.
Traduzir o visual, pictórico, imagético, sinérgico, emergencial, corpóreo-incorpóreo, a materialidade transcendente traz seus problemas.
Os artistas nem sempre conseguem e odeiam explicar a própria obra. Dizem que elas se bastam. É aí que entram em cena os exegetas de sempre, uma casta oligopólica de críticos que vivem por traduzir a nova individual da, é aleatório, tá?, Camargo Vilaça.
E o catálogo não cumpre a função de ajudar o espectador a entender os paralelepípedos empilhados de Nuno Ramos, as tesouras de Lygia Clark, as aranhas peludas de Tunga, as perfurações de Lucio Fontana ou as vacas seccionadas de Damien Hirst. Milhares de citações, um vocabulário afetado e períodos que não terminam nunca fazem o incauto abandonar o maldito papelote, que, paradoxalmente, agrega valor à obra e faz do círculo das artes plásticas um delírio supérfluo pequeno-burguês que, estranhamente, se retro-alimenta.
É por isso que deve-se saudar "Imagem Escrita", que a Paz e Terra lança hoje em São Paulo. Onze artistas contemporâneos brasileiros (Cildo Meireles, José Bechara, Tunga, Angelo Venosa, Antonio Manuel, o já morto Leonilson, Cafi (?), Artur Barrio, Nuno Ramos, Daniel Senise e Flávia Ribeiro) ganham 16 páginas cada e a possibilidade de escolher um "tradutor" para falar do trabalho.
A idéia é da psicanalista carioca Renata Salgado, 35, que assim a define: "As pessoas compram livros de artistas plásticos, mas dificilmente se arriscam nos textos que os acompanham. Apenas vêem as fotos. Se as idéias do meu livro conseguirem circular entre pessoas não ligadas às artes plásticas, ficarei muito feliz."
Renata não queria citações filosóficas ou notas de rodapé "de jeito nenhum" e fez questão que cineastas (Domingos Oliveira, Daniela Thomas), compositores (Bernardo Vilhena, Arnaldo Antunes) e até mesmo críticos, desde que expurgados do academismo (Marco Veloso, Luiz Osorio), estivessem no projeto.
Quatro críticos, aliás, foram convidados. Dois não toparam abandonar o "estilo". Ficaram de fora.


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