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"Olhos de Farol" retoma simpatia pela marginália
do enviado ao Rio
"Olhos de Farol" parte de uma
premissa que poucos na sagrada
MPB parecem dispostos a tolerar:
nele, Ney sugere simpatia por artistas marginalizados pelo mercadão de pulgas e parece mesmo
querer jogar foco sobre certas
sombras com uns olhos de farol.
A tática remete a seu próprio
passado musical. Rendendo-se a
artistas como Itamar Assumpção,
Lenine e Pedro Luís, que só conseguiram aparecer aos 30 e poucos
anos, refaz sua própria trajetória.
É um apreço pelo underground,
que reprisa, ainda que de modo
empalidecido, a fratura que Ney,
João Ricardo, Gerson Conrad e
Marcelo Frias causaram em 73, ao
lançar "Secos & Molhados".
Era o primeiro -talvez o único- disco brasileiro sobre "outing" (sobre sair do armário, assumir-se gay, essas coisas). Impressionou quem quer que o tenha ouvido, mesmo que à revelia. Por
acaso ou não, até hoje esse disco
ecoa -Capital Inicial acaba de regravar "Assim Assado" , Renato
Braz fez o mesmo com "El Rey".
De lá em diante, em preciosidades como "Ney Matogrosso" (75) e
"Bandido" (76), Ney arcou sozinho com a corda bamba entre paródia/estereótipo e pura coragem.
Pois bem, "Olhos de Farol" vem,
após uma fase de sofisticação artificiosa, reencarar o mito pop. Nesse sentido, é tanto fusão do maluco
anterior com o técnico de agora
quanto retomada titubeante do artesão íntegro dos anos 70.
O que há de mais devedor a sua
própria história é o que mais funciona no CD. É o caso de baladas
singelas como "Novamente",
"Poema" (letra inédita de Cazuza,
em melodia que evoca bem de longe o clássico "Sangue Latino") e
"Chance de Aladim", cantadas
sem os arroubos que vinham caracterizando seus discos recentes.
É o caso, também, de semi-épicos como "Mais Além", "Bomba
H" (da lavra de Itamar Assumpção, que a co-autora Alzira Espíndola gravou em 96) e "A Cara do
Brasil" (de Celso Viáfora e Vicente
Barreto, em arranjo ultra-sofisticado e nada afetado).
Mas, tateante ainda na volta a seu
habitat natural, Ney escorrega em
modismos aqui e ali. "Miséria no
Japão" e "Fazê o Quê?", de Pedro
Luís, soam menos naturais na voz
e nas percussões de Ney que nas do
autor e de seu grupo A Parede.
A faixa-título, de Ronaldo Bastos
e Flávio Henrique, recai na "alma"
piegas em que Ney vinha insistindo em anos recentes. O arranjo de
"Vira-Lata de Raça", de Rita Lee,
com sopros à Skank, resulta mais
vira-lata que de raça, o que se intensifica em "O Som do Mundo",
de Samuel Rosa e Chico Amaral.
Desvela-se aí a face acomodada
do artista, que o tornou menos interessante do que é de fato ao longo dos anos e ainda se faz presente
nesse disco. Ney é incomum ao
(ainda) abrir olhos de farol a certos
subterrâneos, mas talvez pudesse
dar um pouco só de ouvidos ao
moleque Marilyn Manson. (PAS)
Disco:Olhos de Farol
Artista: Ney Matogrosso
Lançamento: PolyGram
Quanto: R$ 18, em média
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