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CINEMA
Fajr Film, em sua 19ª edição, apresenta 400 trabalhos, 23 deles em competição; obras iranianas formam longas filas
Festival do Irã recusa filmes premiados
IVONETE PINTO
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM TEERÃ
A capital do Irã vive dias de euforia. Desde o dia 31 de janeiro,
Teerã abriga dois grandes festivais internacionais: o Fajr Theatre, de teatro, e o Fajr Film Festival, de cinema. O de cinema, em
sua 19ª edição, é o que mobiliza
maior público. A estimativa é de
que 20 mil pessoas assistam aos
filmes dos diversos programas,
que vão desde filmes em competição até homenagens a Robert De
Niro e Roberto Rosselini.
O festival abriu com "Baran", de
Majid Majidi, o mesmo diretor de
"Crianças no Paraíso", que concorreu ao Oscar de filme estrangeiro no ano passado. Este ano, o
escolhido para representar o Irã
no Oscar é "Tempo de Embebedar Cavalos", de Bahman Ghobadi (leia texto nesta página).
Fazem parte da programação
do 19º Fajr Film Festival 400 filmes. Em competição, são 23 filmes iranianos e 19 estrangeiros
(veja quadro ao lado).
As 25 obras iranianas na disputa
pelo melhor filme formam filas
intermináveis, cujos ingressos foram vendidos antecipadamente.
Essa correria toda tem uma explicação. Afora o fato de que os iranianos em geral têm adoração por
cinema, o público sabe que pode
ser a única oportunidade de ver os
filmes na íntegra. Depois, a chance de sofrerem cortes é tão certa
quanto o fato de que Reza Pahlevi
não é mais o rei.
Criado nos anos 80 pelo atual
presidente Mohammad Khatami,
então ministro da Cultura, o Fajr
(fajr em farsi significa "brilho",
"iluminação") é o canal de expressão que mais ousa contestar o
regime. Por contestação entenda-se algo muito discreto, sugerido,
metafórico. É nas entrelinhas que
os cineastas falam.
Mas há os que ousam mais e
atrevem-se a tocar em temas tabus para a república islâmica xiita, como aborto e prostituição.
Esses são temas do longa de Jafar
Panahi, "O Círculo", ganhador do
último Festival de Veneza. Mesmo com o Leão de Ouro, o filme
não obteve autorização para ser
exibido no Irã. Pior, foi recusado
até para participar do Fajr Festival.
Exibição
Outro cineasta premiado que
enfrenta problemas com a censura é Hassan Yekta Panah. Panah,
ganhador do Camera D'Or em
Cannes no ano passado, é diretor
de "Djomeh", exibido na última
Mostra Internacional de Cinema
de São Paulo.
"Djomeh" obteve autorização
para entrar em cartaz, mas curiosamente foi recusado para a mostra competitiva do festival. Apenas será exibido na mostra paralela Festival dos Festivais, fazendo
companhia a "Central do Brasil".
Yekta Panah, ex-assistente de
Abbas Kiarostami e do próprio
Jafar Panahi, também espera uma
sala para colocar seu filme em cartaz. Co-produzido com a França,
"Djomeh" sofre a mesma censura
não declarada por que passa Panahi e Abbas Kiarostami.
Kiarostami ganhou diversos
prêmios em festivais internacionais com o seu "O Vento nos Levará" e há dois anos aguarda uma
sala de cinema para exibi-lo no
Irã. Só em Teerã são mais de 70
salas, mas os distribuidores alegam que "não há onde passar".
Yekta Panah, 37, atribui esse fato à interferência política do Ministério da Cultura.
Segundo ele, apesar de as salas
de cinema serem propriedade de
grupos privados, o ministério,
não oficialmente, determina o
que é ou não apropriado para
chegar ao público, numa audiência que alcança facilmente 3 milhões de espectadores para cada
filme de sucesso. E são muitos no
Irã, que ostenta uma produção
anual média de 70 filmes.
Ivonete Pinto é jornalista e autora de
"Descobrindo o Irã" (ed. Artes e Ofícios)
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