OLGÁRIA CHAIM FÉRES MATOS
especial para a Folha

Conta-se de Sócrates -patrono de todos os filósofos e da Filosofia- que relutava e mesmo recusava ser "filósofo". Diferenciando-se do "sábio" do Oriente -que não procura a verdade porque a tem-, Sócrates preferia se chamar "amigo do saber".
Buscando a definição dos valores -o que é o Bem? O Belo? O Verdadeiro?-, preservava-os em estado de questão, prometia sua essência inalterável, essência que só se revelava comunicando, antes, nossa própria ignorância.
Encaminhando-se para a praça do mercado, escutava a todos que lhe dirigissem a palavra: não se considerava senhor de nenhuma verdade e mestre de ninguém. Afastava-se, por vezes, de Atenas, solitário, margeando o rio Ilissus, convivendo com suas reflexões.
Oscilando em permanência da Ágora à solidão do pensamento, a Filosofia é silencioso diálogo da alma consigo mesma e conversação rumorosa a céu aberto, acerca de questões sujeitas sempre a novas dúvidas e considerações. Aqui se reconhece o sentido originário da idéia filosófica: por sua inconclusão, estamos abertos à verdade.
Dispensador generoso de momentos filosóficos -em "pianíssimo", Sautet nos deixou. Distribuiu-se para todos, de Paris a Amsterdã, de Tóquio a São Paulo. Preparava a continuação de viagens, do Canadá ao México, do Chile ao Brasil. Reuniu, em sua vida, o princípio a seu fim: cidadão do mundo, estava entre aqueles que, no maio de Paris, se reconheceu no líder estudantil condenado a abandonar a França.
Duplamente estrangeiro, Cohn Bendit o encontrou entre os que responderam: "Somos todos judeus alemães". Internacionalista antes, cosmopolita agora, estará presente em todos os que, com reverência e admiração respeitosa, buscarem palavras e livros porque a vida do espírito desconhece a morte.