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Rompimento com PC alavanca carreira
DA REPORTAGEM LOCAL
"As dúvidas crescem, não devemos duvidar, não queremos duvidar, queremos continuar com a
crença intacta, a certeza, o ideal.
Nas noites insones, nos contemplamos, Zélia e eu, um nó na garganta, vontade de chorar."
Jorge Amado e Zélia Gattai estão exilados em Praga, entre 1951
e 1952, quando começam a conhecer o terror stalinista. Isso
acontece ainda antes que, já com
Nikita Kruschev no poder na então União Soviética, a partir de
1953 e sobretudo após 1956, ele
fosse divulgado ao mundo.
Em vários trechos de suas memórias, semiexpostas no livro
"Navegação de Cabotagem", de
1992, Amado vai revelando a decepção com o comunismo e sobretudo com Josef Stálin, o "Zé
dos Bigodes", como o apelidava o
camarada Oscar Niemeyer.
Stálin era seu ídolo na época em
que militou no Partido Comunista Brasileiro, entre meados dos
anos 30 e 1955, quando pede sua
desfiliação. "Fui stalinista de conduta irreprochável, subchefe da
seita, se não bispo ao menos monsenhor, descobri o erro, custou
trabalho e sofrimento, deixei a
missa em meio, saí de mansinho",
revisa ele em suas memórias.
"É uma questão geracional. Nos
anos 30 há uma grande polarização entre a direita e a esquerda.
Todo mundo toma partido, e há
um enorme contingente de intelectuais que se liga ao Partido Comunista, não só Jorge Amado.
Quando ele se decepciona, muitos
se decepcionam também", diz o
cientista social Albino Rubim, autor do livro "Marxismo, Cultura e
Intelectuais no Brasil" (Edufba).
Militante aplicado, o escritor
chegaria a se tornar deputado federal pelo Partido Comunista, e
cassado dois anos mais tarde. A
militância influencia a literatura:
escreve "O Cavaleiro da Esperança" (1942), biografia de Luiz Carlos Prestes, e atinge o ápice em
termos de engajamento em 1958,
com a publicação da trilogia "Os
Subterrâneos da Liberdade".
Embora afirmasse a "continuidade" de sua obra, o rompimento
com o partido causaria uma guinada rumo ao início da carreira,
quando a região do cacau e seus
personagens eram o foco central
de sua ficção. Surge então "Gabriela, Cravo e Canela" (1958).
Ao abandonar o comunismo,
Jorge Amado descobre o humor.
Ele próprio, porém, atribui a leveza desta segunda (ou terceira) fase
de sua literatura mais ao amadurecimento que ao "desengajamento"."O escritor novato é sério
demais. Precisei amadurecer para
alcançar o humor", argumentava.
Apesar de já não-militante, Jorge Amado continuou se definindo
como um escritor "voltado para o
povo". O que não o impediu de
aproximar-se de um representante da elite baiana, um "coronel"
como os que retratou em seus livros: Antonio Carlos Magalhães.
Contradições do materialista
que simpatizava com o candomblé, ou do ex-comunista que seguiu flertando com o socialismo,
como deixa claro em uma de suas
últimas entrevistas, ao jornal português "Expresso", em 1998: "O
contrapeso para o capitalismo só
pode ser o socialismo. Só resta o
socialismo, mais nada".
(CYNARA MENEZES)
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