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CINEMA/ESTREIAS
Crítica/"Marido por Acaso"
Longa fracassa ao querer seguir passos de "Sex and the City"
Sem o sarcasmo e a autogozação típicos da série, longa ultrapassado se resume a comédia de estranhamentos
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
O mapa dos afetos numa
metrópole contemporânea foi o eixo que fez
de "Sex and the City" uma das
mais cultuadas ficções do nosso
tempo, hábil em captar as flutuações do desejo, as modas e
manias, revelando sentimentos
de insatisfação comuns a mulheres e homens. A comédia romântica "Marido por Acaso"
tenta seguir os passos de Carrie
Bradshaw e companhia. Sem se
arriscar no mesmo tanto de
sarcasmo e de autogozação, no
entanto, o filme limita-se a reproduzir modelos de satisfação
ultrapassados.
Uma Thurman é Emma, psicóloga de autoajuda e apresentadora de um programa de rádio no qual responde a dúvidas
afetivas seguindo o modelo de
fórmulas prontas, com plena
crença na veracidade das estatísticas. Assim, Emma aplica a
racionalidade e impede seus
ouvintes de caírem vítimas dos
irracionalismos do coração.
Como prova de que o destino
não se controla, os conselhos
dela acabam por atrapalhar a
vida sentimental de Patrick,
um bombeiro que está prestes a
se casar com Sofia. Para se vingar, o coitado coloca em risco a
iminente união da apresentadora com seu par perfeito, o almofadinha Richard.
As turbulências emocionais,
contudo, não chegam, como
nos bons momentos de "Sex
and the City", a alcançar a perspicácia quase antropológica na
representação do narcisismo
como veículo das nossas solidões. A graça fica restrita ao esquema clássico da comédia, em
que dois tipos aparentemente
sem nenhuma identidade são
obrigados a conviverem, situação na qual o humor deriva diretamente do estranhamento.
Para fazer esse esquema render, a direção habilidosa do
bom comediante Griffin Dunne aposta no poder do trio central de atores, na medida para
encarnar caricaturas sem que
isso diminua o encanto que
exercem sobre o público. Uma
Thurman e Colin Firth repetem papeis que receberam em
Katherine Hepburn e James
Stewart suas mais antológicas
encarnações, sem, claro, atingir
aquele nível de perfeição. Já o
menos conhecido Jeffrey Dean
Morgan desestabiliza, com seu
ar rústico, a imagem ultrabotoxada do par de noivos.
Por trás da aura de divertimento inofensivo, contudo,
"Marido por Acaso" é um filme
ultrapassado e não só porque
repete recursos de uma estética
clássica. Enquanto as "comédias de recasamento" dos anos
30 escondiam um jogo subversivo ao ironizar o papel social
então designado às mulheres,
"Marido por Acaso" tenta nos
convencer de que, ao fim de
tantas conquistas, o único desejo ainda não realizado das
mulheres liberadas do século
21 é ter um homem para chamar de seu.
MARIDO POR ACASO
Direção: Griffin Dunne
Produção: EUA/Reino Unido, 2008
Com: Colin Firth, Jeffrey Dean Morgan e Uma Thurman
Onde: a partir de hoje nos cines
Bristol, Frei Caneca, Kinoplex Itaim
e circuito
Classificação: 12 anos
Avaliação: regular
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