São Paulo, segunda-feira, 07 de outubro de 2002

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Fundações Guggenheim e Daniel Langlois lançam projeto para salvar arte perecível

Preservando a vanguarda

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

O projeto, dizem seus organizadores, é ambicioso e necessário: conceder a chance de imortalidade para obras de arte produzidas, de modo acelerado, na segunda metade do século 20. Trabalhos feitos -seguindo a condição imposta pela imaginação de cada artista- com terra, filme, chocolate, internet, esterco de elefante ou qualquer outra "mídia variável".
A "Variable Media Initiative" (VMI), que pretende desenvolver uma política de preservação para a arte contemporânea, é resultado de um consórcio entre a norte-americana Fundação Guggenheim e a Daniel Langlois Foundation for Art, Science and Technology, do Canadá.
A parceria foi oficialmente apresentada a museus e curadores durante um simpósio realizado em Nova York, no final do último verão dos Estados Unidos.
"No centro do conceito de mídia variável está um questionário que estamos elaborando", disse à Folha Alain Depocas, diretor do centro de pesquisa e documentação da Daniel Langlois Foundation, por e-mail, de Montréal. "O objetivo do questionário, que está ligado a uma base de dados", diz ele, "é descobrir, a partir do testemunho do artista, onde estão os limites para as intervenções que poderão ser feitas no futuro por conservadores e museus".
Os artistas terão que responder questões fundamentais sobre o propósito e a natureza de seus trabalhos. Depois, definirão qual o "estado ideal" das obras. Se, por exemplo, devem ser "instaladas", "executadas" ou "exibidas em rede". Terão ainda que fornecer o maior número possível de material sobre a criação.
A VMI pretende colocar o questionário em rede e, assim, conseguir criar uma base de documentação na qual os artistas terão a palavra final. Quanto aos já mortos, há a chamada "questão moral". O passo seguinte será permitir o uso dos questionários respondidos por todas as instituições culturais interessadas.
"Um dos maiores objetivos, nessa parceria com o Guggenheim, é estabelecer uma rede internacional de organizações, que tentarão implementar os conceitos da VMI. Isso pode afetar a maneira como os museus lidam com a preservação de novas formas de arte, as que não são feitas com materiais estáveis, e sim efêmeros", diz Depocas.
Ele cita então um exemplo. O tipo de problema enfrentado hoje por curadores e conservadores. "Em relação à mídia tradicional, como a pintura, há uma longa história de pessoas lutando pela primazia, no que se refere à conservação: os que acreditam ser necessário para a obra adquirir um certo tom dado pelo envelhecimento, e os que defendem a restauração total."
"O artista americano Bill Viola é um caso que enfrentamos neste instante", Depocas continua. "Viola utiliza agora uma versão em DVD de suas primeiras instalações e certamente não se oporia ao uso de um melhor tipo de monitor, se ele não arruinasse os efeitos perseguidos em seu trabalho."
"Se Viola usasse um velho aparelho em preto-e-branco", ele prossegue, "que enviasse o espectador para um certo fenômeno da memória, vindo do passado, seria impossível imaginar um substituto. Com a VMI poderemos ter uma opção".

Performances
E quanto às performances e instalações? O VMI poderia preservar até mesmo um "conceito", algo essencial para entender a produção contemporânea? A resposta é afirmativa, e mais uma vez o que prevalece é a intenção de manter os criadores em um espaço privilegiado, no qual são eles os principais responsáveis pela manutenção de suas heranças.
"A idéia de mídia variável inclui todo tipo de trabalho artístico; algo que nos leva a um outro obstáculo", fala Depocas. "O fato de alguns serem localizados em um determinado espaço. Eles são, como dizemos em inglês, "site sensitive". Para preservá-los, temos que levar em conta sua variabilidade."
Isso seria então uma interferência na criação do artista? "Não. Em outras palavras, não é possível propor a manutenção indefinida de uma obra em seu estado fixo, mas deixar que ela prossiga, guiada por uma rigorosa metodologia definida pelo criador. Isso abriria a possibilidade de que, mesmo quando o autor não estiver mais presente, para dar instruções, seja sua orientação que prevaleça."


Mais informações:
Guggenheim Museum (tel: 00/xx/1/ 212/423-3840; fax: 00/xx/1/212/423-3787; e-mail: bennis@guggenheim.org) e The Daniel Langlois Foundation (e- mail: info@fondation-langlois.org)


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