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Pinky Wainer faz vestidos conceituais
KATIA CANTON
especial para a Folha
Depois de quase três anos sem
expor, Pinky Wainer reaparece em
dose dupla: ela inaugura individual na galeria São Paulo, no dia
26, e mostra no Paço Imperial, no
Rio, a partir de 5 de março.
Não que o tempo afastada do circuito das galerias tenha sido de
pausa. Ao contrário, Wainer não
parou quieta um minuto. Nesse
sentido, o título da mostra revela-se emblemático.
"Labirinto, Faísca, Silêncio, Revelada, Avesso, Norte, Imensa"
formam apenas algumas das cem
palavras escritas e reescritas sobre
uma tela de 1,70 por 1,50 metros.
Trata-se da última obra realizada
para a exposição.
A tela, intitulada "Vestido nº 32
- Monitoria" demorou três meses
para ficar pronta. São apenas palavras, escritas, apagadas e reescritas
coincidindo com mudanças da
própria artista. Retiradas de um
diário de palavras que Pinky Wainer constrói há anos, elas terminam, no quadro, de forma simbólica: "imensa ficção".
"Eu fui pintando e escrevendo,
feito contagem de tempo de presidiário em cadeia. Apelidei o quadro de `Vestido nº 32 - Monitoria'
porque estou comentando o universo feminino do vestido. Ao
mesmo tempo, falo da pintura da
vontade de subverter aquele tom
didático de se tentar explicar uma
obra de arte. No final, `imensa ficção' me deu liberdade."
Artista autodidata, Wainer foi
autora de uma iconografia abundante, com homens tatuados, árvores, espinhas de peixes, panteras, estrelas de David, carimbando
suas aquarelas desde os anos 70.
A partir de 94, ela levou esse universo imagético para as telas e
mergulhou num fascínio pela descoberta das tintas e superfícies.
Desde então, imersa numa pesquisa pictórica levada a cabo com
rigor e obsessão, Wainer passou a
pintar um único tema: o vestido.
O estreitamento foi foco temático e trouxe efeito oposto: permitiu
que a artista alargasse as possibilidades de construções da pintura e
levou-a a investigações sobre a
poética do universo feminino.
Reduzindo essa narrativa a uma
única e austera figura -a do vestido tubo, sem mangas- ela rumou
a investigações sutis.
Uma delas é um exercício de corte e costura sobre a matéria-prima
pictórica. Ele toma corpo na maneira como Wainer sobrepõe tramas de cores, linhas e imagens,
que são desenhadas, apagadas e
refeitas.
A inquietação da artista torna-se
uma seriação orgânica de vestidos
e contornos, variável pelo ritmo
das repetições e colagens de tecidos, que são depois arrancados,
acumulando resíduos.
Pinky Wainer toma partido do
fato de que a pintura contemporânea não se constrói apenas pelo intermédio do pincel e da tinta. A artista pinta grudando e desgrudando da tela vestidos reais, que são
encharcados de tinta, ora embebidos em pasta de gesso, sal grosso e
pó de ferro.
Nessa ação, as obras revelam texturas, registram marcas meio apagadas, comentam o passado do
vestido e suas memórias. As telas
tornam-se vultos.
É aí que as investigações passam
a manipular o vestido dentro do
universo feminino. O mais óbvio
vem carregado de clichês sobre
moda, fetiche, sexo, feminilidade.
O desafio de Pinky Wainer passa a
ser repetir a forma do tubinho à
exaustão até esvaziá-la de seus
conteúdos mais banais.
Aí brotam as palavras que carimbam certas telas. Aí acontece a síntese formal, de onde, do vestido, só
se vê o rastro do fecho eclér. "São
as sobras da alma", conclui.
Exposição: Labirinto, Faísca, Silêncio,
Revelada, Avesso, Norte, Imensa
Onde: Galeria São Paulo (r. Estados Unidos,
1.456, tel. 011/852-8855)
Quando: 26 de fevereiro, às 21h; até 19 de
março
Onde: Paço Imperial (praça 15, 48, Rio de
Janeiro)
Quando: de 5 de março a 13 de abril
Quanto: R$ 3.000 a R$ 5.000
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