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MERCADO EDITORIAL
Entidade de editoras teme mudanças que estão sendo conduzidas pelo presidente da Biblioteca Nacional
Corrêa do Lago causa receio por Lei do Livro
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Com 1,92 m de altura e 100 kg,
Pedro Corrêa do Lago é uma metáfora ambulante de seu próprio
estilo. Adotando a linha "trator",
o presidente da Fundação Biblioteca Nacional tem mudado a cara
da vetusta instituição e, também,
angariado antipatias.
Estas não surgem tanto pelas alterações que vêm sendo feitas na
FBN desde janeiro de 2003, quando Corrêa do Lago assumiu, mas
pelos superpoderes desse carioca
de 46 anos. Com a morte do poeta
Waly Salomão em maio do ano
passado, a Secretaria do Livro e da
Leitura foi extinta e suas atribuições passaram para a Biblioteca
Nacional. Hoje, Corrêa do Lago é
a voz do governo quando o assunto é literatura.
"O problema é saber se os poderes pertencem ao cargo ou ao Pedro, que é muito centralizador. Se
ele sair, como fica? As decisões sobre livro no Brasil precisam ter
uma continuidade", diz um editor, pedindo anonimato.
Se os editores ainda não batem
abertamente de frente com Corrêa do Lago, um dos motivos é a
expectativa em torno da Lei do Livro. Aprovada no Senado em 31
de outubro de 2003, a Lei 10.753
precisa ser regulamentada por decreto presidencial. E o governo
determinou que o presidente da
FBN conduza a regulamentação.
Notório batalhador pela lei, o
Snel (Sindicato Nacional dos Editores do Livro) demonstra preocupação por não estar sendo ouvido. "Soube por um e-mail que o
fórum da regulamentação é a Biblioteca. Não me furto a conversar com qualquer interlocutor,
mas a discussão precisa ser ampla
e transparente", afirma o presidente do Snel, Paulo Rocco.
"Estamos fazendo consultas às
associações do setor, recolhendo
sugestões, já tem muita gente se
mexendo", diz Corrêa do Lago.
Um dos artigos da lei que o Snel
não admite é o que prevê que todos os contratos firmados entre
autores e editoras sejam registrados na FBN. "O presidente da Biblioteca saberá de tudo o que
acontece no mercado. Isso é um
absurdo", diz um editor.
Com a suspensão pelo Ministério da Educação do PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola), Corrêa do Lago também
responde pelo único programa federal para compra de livros paradidáticos em 2004: o Fome do Livro. Serão comprados, neste ano,
700 exemplares de cada um dos
2.500 títulos escolhidos. Até 2006,
o objetivo é alimentar com acervos 1.200 novas bibliotecas, passando todo município brasileiro a
ter uma.
Em todas as suas ações, Corrêa
do Lago diz buscar que "a Biblioteca tenha uma presença maior
no público". Essa seria a justificativa para realizar eventos não diretamente ligados ao acervo da
instituição, como a exposição comemorativa dos 60 anos de Chico
Buarque, que será aberta no fim
de junho.
"É um reconhecimento simbólico da contribuição do Chico ao
trabalho da palavra no Brasil. Para mim, esse é um papel da Biblioteca", diz Corrêa do Lago. "E tem
um sentido estratégico, porque,
por causa da exposição, pessoas
novas conhecerão nosso acervo."
Muitos dos seus projetos possuem o mesmo objetivo. Por
exemplo: quando acabarem as
obras do quarto andar, ele abrigará a mostra "Tesouros da Biblioteca", para que o público veja
itens raros como a Bíblia de Mogúncia, de 1462. E ainda neste ano
será aberta uma sala-biblioteca
com cara de livraria: as pessoas
poderão ler os livros disponíveis
ali sem burocracias.
Corrêa do Lago também tem
mexido no orçamento de R$ 34,6
milhões da Biblioteca para realizar ações que tenham mais impacto. Por exemplo: em vez de vários prêmios literários, como era
no passado, agora só existe o Prêmio Fundação Biblioteca Nacional, que dará R$ 80 mil ao autor
do melhor livro do ano.
"A Biblioteca tem uma marca
muito boa, mas estava dormente", acredita Corrêa do Lago. Ele
procura se policiar, porque declarações suas já geraram atos de desagravo a Eduardo Portella, professor e imortal da ABL (Academia Brasileira de Letras) que presidiu a FBN de 1997 a 2003.
"Eu desejo ao meu sucessor que
consiga mais do que eu consegui.
Sei que fiz o que eu podia e que
não houve inércia alguma", afirma Portella, citando a informatização por que passou a Biblioteca
e a vinda de intelectuais como Susan Sontag e Carlo Ginzburg.
Reformas
É nítido que Corrêa do Lago
quer adaptar a FBN a seu estilo.
Reformou o estatuto, mudou o
organograma, demitiu cerca de
200 pessoas e tem aberto diversos
caminhos para que dinheiro privado entre no caixa.
Ele assume que, além do seu
temperamento, tanta voracidade
se explica pelo desejo de reverter a
imagem, difundida no meio editorial, de que é "uma raposa no
galinheiro". Corrêa do Lago é um
dos maiores colecionadores de
documentos, fotos e livros raros
do país, além de ser dono de uma
editora (a Capivara) em sociedade com a mulher, Bia Fonseca, filha do escritor Rubem Fonseca.
"Eu também achei que teria
momentos de recreio na Biblioteca, porque amo e conheço muito
esse acervo. Mas só tive três recreios, de duas horas cada, porque não paro de trabalhar", diz
ele. "E é a Bia quem está cuidando
da Capivara, que está proibida de
propor projetos para captar recursos públicos."
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