São Paulo, quarta, 8 de julho de 1998

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'Britpop' em crise

Reuters
Liam Gallagher, vocalista do Oasis, um dos grupos britânicos que registrou queda nas vendas com relação a 95



Bandas do pop britânico registram queda nas vendas de discos e ingressos para shows; produtor do grupo Oasis, Alan McGee, atribui o fenômeno ao fato de a música não representar mais uma 'postura ideológica'


ISABEL VERSIANI
de Londres

O cenário musical inglês está em crise. Quem atesta é a revista semanal "New Musical Express", a bíblia dos amantes da música no Reino Unido. Em matéria publicada na sua segunda edição de junho, a "NME" mostrou que está havendo uma queda no número de discos, fitas e ingressos para shows vendidos no país. Álbuns novos de bandas como Pulp e Oasis estão vendendo, este ano, menos do que em 1995. Pelo menos um evento musical -o Festival Universal, na cidade de Knebworth- teve que ser cancelado por falta de público. A Xfm, uma das últimas estações independentes de Londres, foi vendida porque não conseguiu cumprir suas metas em número de ouvintes. "Há tantas coisas erradas com a maneira como a música está sendo descoberta, feita, embalada, tocada e vendida para nós nesse país que é bem difícil saber onde colocar a culpa. O que parece é que há uma conspiração de circunstâncias que levaram a essa crise", afirmou a "NME". Como exemplo de queda de vendas, a revista citou o caso da banda Pulp. Em outubro de 1995, quando lançou o disco "Different Class", o grupo liderou a lista dos mais vendidos, com 133 mil cópias na primeira semana. Em abril deste ano o grupo também estava em primeiro lugar na lista dos mais vendidos, com o disco novo "This Is Hardcore", mas dessa vez apenas 50 mil cópias foram vendidas na semana de lançamento. Para Alan McGee, produtor musical que descobriu o grupo Oasis, uma das principais causas da queda das vendas de discos em geral é o fato de a música não estar representando mais uma "postura ideológica", como aconteceu com o punk ou a música acid. Em artigo publicado na revista, McGee afirma que o computador tomou o lugar da música como símbolo de contestação. "Não há mais rebeldia na música. Se você tem 15 anos e compra um laptop, sua mãe nem sabe como ligá-lo. Isso é rock'n'roll!", escreveu McGee. Jeff Smith, responsável pela política musical da Radio 1, a estação de rádio pop mais ouvida do Reino Unido, também acha que está havendo um problema de "identidade" no cenário musical. Segundo ele, o fato de não existir nenhum grande movimento na música, unificando as tendências, dificulta o consumo. McGee também culpa as grandes gravadoras pela crise. Segundo o produtor, ele próprio dono do selo Creation Records, elas teriam parado de investir em novos talentos nos anos 80. Em vez disso, teriam se acomodado na posição de ficar relançando discos de grupos como os Beatles e Led Zeppelin. Outro problema, segundo a "NME", é a concorrência excessiva entre as rádios, que, na corrida para lançar novas músicas com exclusividade, acabam executando excessivamente os discos antes de seus lançamentos, cansando os ouvintes.


Outro lado
No meio dessa enxurrada de queixas, a IFPI (sigla em inglês para Federação Internacional da Indústria Fonográfica) nega que esteja havendo uma crise na indústria do disco.
Segundo Catrin Hughes, diretora de Comunicação da IFPI, o que ocorre é que alguns países estavam registrando índices de crescimento altíssimos que, "naturalmente", não poderiam ser sustentados para sempre.
Hughes também entende que o aumento das vendas pela Internet é uma das explicações para a queda do consumo tradicional de discos. No ano passado, as compras de discos pela Internet responderam por 0,3% da movimentação do mercado norte-americano, que, no total, foi de US$ 11,9 bilhões.
"Essas são vendas legais, que estão substituindo parte do consumo nas lojas tradicionais" disse Hughes à Folha.
McGee prevê que nos próximos dez anos não haverá mais companhias de discos e todas as vendas serão feitas pela Internet. Essa tendência, segundo ele, pode ser uma resposta à crise atual, já que deverá forçar uma queda nos preços.
Independentemente de como venha a ser feito o consumo de discos e fitas, a "NME" prevê que ele pode se recuperar, porque ainda há boa música sendo produzida no Reino Unido.
"De alguma maneira, a música está revivendo. Enquanto bandas são dispensadas das grandes gravadoras e as vendas continuam a cair, algumas pessoas ainda vêem salvação no surgimento de um novo "underground'. Música sendo feita por amor à música. Um novo começo", conclui a revista.



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