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IMPRENSA
"High Times", 25 anos de maconha nas bancas
Associated Press
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O editor-chefe da "High Times", Steve Hager, durante entrevista na redação da publicação |
ROGÉRIO ASSIS
especial para a Folha,
em Nova York
A revista "High
Times",
que defende a legalização da
maconha nos EUA, está
completando 25 anos de
existência neste ano.
O editor-chefe da publicação, Steve Hager, recebeu a Folha para uma entrevista na redação da revista, na Park Avenue
South, área nobre de Manhattan. Ele falou da maconha como cultura, atacou a
política de tolerância zero do
prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, disse que o
governo americano controla
os cartéis da droga espalhados pela América Latina e que
não acha que a maconha deva
ser consumida por jovens. A
seguir, alguns trechos da entrevista.
Folha - Os EUA gastam bilhões de dólares na guerra
contra as drogas. Não parece
um contra-senso sua revista
defender a liberação de uma
delas no país?
Steve Hager - Eu não vendo
maconha, eu vendo revista. A liberdade de imprensa é uma coisa
sagrada neste país. Mesmo que a
maconha seja ilegal, não é ilegal
escrever sobre seus benefícios ou
ensinar as pessoas a cultivá-la.
Folha - Mas não é ilegal plantar ou mesmo consumir a droga
nos EUA?
Hager - Existem seis pessoas
que têm o direito legal de consumir maconha garantido pelo governo federal, há ainda seis Estados que reconhecem a utilização
medicinal da erva. Há uma disputa entre esses Estados e o governo
federal sobre o direito de utilizá-la
legalmente.
Folha - Quantas pessoas trabalham na revista?
Hager - Cerca de 20, a maioria
no departamento de arte. Reportagens e fotos são feitas quase que
totalmente por colaboradores.
Folha - O sr. permite que seus
funcionários fumem maconha
durante o trabalho?
Hager - Claro que não. Pode
não parecer, mas isso aqui é um
local de trabalho não-fumante,
aqui não se fuma nada.
Folha - O sr. fuma maconha?
Hager - Sim, eu fumo, mas não
durante o trabalho.
Folha - O sr. tem filhos?
Hager - Não.
Folha - O sr. acredita que um
jovem que veja sua revista numa banca de jornal deve comprá-la? Ele vai encontrar alguma
coisa útil nela?
Hager - De jeito nenhum, minha revista é dirigida ao público
adulto. Se eu visse um jovem com
ela na mão, iria desencorajá-lo a
ler. Também não acho saudável
jovens usando armas, dirigindo
um carro ou visitando prostitutas.
Tem coisas que são para adultos e
coisas que são para crianças e jovens. Acho que os jovens devem
ficar longe da maconha ou de
qualquer outra droga. Mas, se um
garoto fuma um baseado ou se
envolve com drogas, não acredito
que deva ter sua vida arruinada,
sendo colocado na cadeia.
"Minha revista
é dirigida ao
público adulto,
se eu visse um
jovem com ela
na mão, iria
desencorajá-lo
a ler"
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Folha - O sr. fumaria maconha
na sala da sua casa na presença
de crianças?
Hager - Você convidaria seus
amigos pra beber algumas garrafas de vinho e jogar pôquer com
seus filhos brincando ao redor? É
a mesma coisa. Tem programas
que são para adultos e as crianças
não devem participar. Se eu tivesse filhos, não mentiria para eles,
mas também não fumaria maconha nem cigarro na frente deles.
Folha - Existe alguma organização lutando para a legalização da maconha nos EUA?
Hager - Tem a Normal (National Organization for Reform of
Marijuana Laws), com base em
Washington D.C., para a qual
nossa revista dá total apoio.
Folha - O sr. acredita que um
dia a maconha será legalizada
em todo o mundo, assim como
o cigarro e o álcool?
Hager - Eu acredito que, se a
maconha não for legalizada, a vida das pessoas vai continuar sendo controlada. Os países
que continuarem usando a droga
como desculpa para varrer do
mapa culturas com as quais não
estão de acordo mais cedo ou
mais tarde terão de lidar com o fato de que estão praticando limpeza étnica. Quando a maconha for
legalizada, vão surgir empresas
com grande potencial de crescimento, com
ações na bolsa
e tudo o mais.
Folha - Há alguns anos era
comum fumar
maconha nas
ruas de Nova
York. Depois
da administração do prefeito Giuliani,
com sua política de tolerância zero, isso não é mais
possível. Isso
o afetou de alguma maneira?
Hager - Sem
dúvida. Hoje em dia, se um guarda te pegar fumando um simples
baseado, você vai parar na cadeia.
Há quem acredite que a cidade está mais segura. Pessoalmente, eu
não acho que fumar um baseado
no parque torne a cidade mais perigosa.
Giuliani, como a maioria dos
políticos que estão no poder em
todo o mundo, adota uma política
de proteção aos ricos, em vez de
melhorar a qualidade de vida dos
mais necessitados. A polícia deveria ser mais seletiva com o tipo de
crime a combater.
Folha - O sr. mostrou uma fotomontagem do presidente Bill
Clinton segurando um baseado
na capa de sua revista. Isso lhe
causou algum
problema?
Hager - Não.
Folha - O sr.
acha que não
teve problema
por causa da
liberdade de
imprensa ou
porque o presidente nem
tomou conhecimento?
Hager - Tenho certeza de
que ele soube.
Mas você pode
fazer quase tudo o que quiser
com uma celebridade.
Folha - O sr. colocaria o prefeito Giuliani fumando um baseado na capa de sua revista?
Hager - Claro que sim.
Folha - De que forma o sr. acha
que ele reagiria?
Hager - Se ele tentasse tomar alguma medida contra nós por causa da brincadeira, o resto da imprensa sairia em nossa defesa e
ganharíamos uma grande publicidade, pois, como já disse, a liberdade de imprensa é sagrada.
Folha - Os assinantes de sua
revista recebem seus exemplares em envelopes, por quê?
Hager - Para evitar que os vizinhos tomem conhecimento e não
inventem histórias para a polícia
em busca de recompensa. O sistema judiciário americano está baseado no que eu costumo chamar
de "testementir", não testemunhar. A Justiça incentiva as pessoas a inventar histórias e assim
faturar algum com a recompensa.
Muita gente tem sofrido acusações injustas. Instalou-se a "testementira", em que um inventa algo
sobre o vizinho para encobrir
suas próprias falhas, e o inocente
sempre acaba pagando pelo que
não fez. E é nesse sistema que a
guerra contra as drogas está baseado.
Folha - O sr. se preocupa em
saber como a maconha é vista
no resto do mundo. Na América
Latina, por exemplo?
Hager - Nós fizemos uma matéria sobre ayahuasca na Amazônia.
Na verdade, nós cobrimos qualquer grande evento sobre maconha. Se no Brasil houver algum
festival, voaremos até lá para testar a maconha brasileira e falar
sobre ela aos nossos leitores.
Folha - Então o sr. só está
preocupado em escrever sobre
a qualidade da droga?
Hager - Não existe maconha
ruim, existe maconha fraca. Aí é
só fumar dois baseados
em vez de um (rindo). Na
verdade, a "High Times" é
mais do que uma revisita
sobre maconha, mas
uma revista de contracultura, de cultura hippie. A "High Times" é a
única publicação especializada em contracultura. Seus leitores sabem que vão encontrar
respaldo para suas
crenças e pensamentos.
Folha - O sr. acha
que a guerra contra
as drogas tem alcançado os resultados
esperados pelo governo?
Hager - Se você
acha que espalhar
veneno em plantações, matar centenas de pessoas, fazer acordo com
chefes de cartel para trazer droga para os EUA e ganhar
muito dinheiro
com isso são resultados bons, então
estão fazendo um
trabalho magnífico.
Folha - O sr.
acredita mesmo
que o governo americano faz
acordo com os cartéis?
Hager - Como alguém pode
não acreditar nisso? Como alguém pode ser tão inocente e
acreditar que os químicos usados
para produzir cocaína, fabricados
por empresas americanas e mandados para a América do Sul, não
podem ser rastreados pelo governo americano. Como alguém pode acreditar que bancos que aparecem e desaparecem para lavar o
dinheiro do narcotráfico não podem ser rastreados? O sistema foi
erguido para operar dessa maneira. Isso é um grande negócio, talvez o maior de todos.
As agências de inteligência certamente estão envolvidas nisso.
Eles não vão deixar qualquer traficante cuidar de trilhões de dólares. É uma questão de segurança
nacional. Você acredita que eles
vão deixar dois ou três colombianos controlarem todo esse dinheiro sem se envolverem?
É óbvio que todo o sistema está
corrompido, desde os mais altos
escalões. Nós temos visto vestígios de cocaína dentro da Casa
Branca desde o governo Bush,
bem debaixo do nariz dele, dentro
de seu escritório. Como acreditar
que eles não estão envolvidos.
Folha - A "High Times" fala
apenas de maconha, vocês são
contra as outras drogas?
Hager - Eu pessoalmente acho
que alguém que consome drogas
químicas ou sintéticas está jogando roleta-russa. Quem consome
esse tipo de droga provavelmente
está colocando seu dinheiro na
mão do crime organizado.
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