EVA GLENK
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Estou profundamente frustrado." Esta é reação de um dos leitores do jornal austríaco "Die Presse" ao Prêmio Nobel para Elfriede Jelinek. Nem todo o mundo se alegra com a notícia de ela ter sido a décima mulher da história a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura.
Elfriede Jelinek, autora austríaca que não vê nenhuma glória para a Áustria no fato de ela ter recebido o Nobel, certamente causa polêmica entre leitores e críticos. Festejada por alguns, odiada por outros, ela mesma admite sentir "mais desespero do que alegria" ao receber o prêmio.
Os sentimentos fortes que ela suscita são proporcionais à força crítica, quase destrutiva, dos seus textos, que, no entanto, nas palavras da comissão julgadora, merecem o prêmio "pelo fluxo musical de vozes e vozes contrariantes, que revelam em uma linguagem de extraordinária paixão o absurdo e a força coercitiva dos clichês sociais".
Nada escapa à sua crítica feroz: nem as relações entre homem e mulher, pais e filhos, autoridades e subalternos, nem a sua terra natal. O papel da mulher, a violência, as relações de poder na sociedade e a sexualidade são temas recorrentes em sua obra, que chama a atenção sobretudo pela sua linguagem.
Os valores e princípios amplamente irrefletidos e cegamente aceitos de uma sociedade, inscritos nos estereótipos lingüísticos, são o alvo do seu jogo com as palavras.
Desconstruindo os estereótipos lingüísticos, a autora questiona as normas morais, as etiquetas sociais, a definição dos papéis dos indivíduos, as opiniões vigentes. É isso o que irrita nela: a sua tendência de encarar a verdade de forma quase desumana.
Pouco conhecida ainda no Brasil, certamente devido à dificuldade que suas obras oferecem ao tradutor, o filme "A Professora de Piano", do diretor austríaco Michael Haneke, baseado no romance de traços autobiográficos "Die Klavierspielerin" (A Pianista), pode ser o primeiro contato com uma autora que merece a atenção do leitor.