São Paulo, sábado, 08 de outubro de 2005

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MEMÓRIA

Tereza Albues era dona de uma verdade assustadora

GERALD THOMAS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Faleceu, aqui em Nova York, na quarta-feira passada, a escritora fabulosa Tereza Albues. Mas esse artigo não será factual, pois mal consigo conter as lágrimas e não sei se conseguirei ser coerente. É que Tereza era uma das minhas melhores amigas. Minto. Ela era mais do que isso. Conselheira e dona de uma verdade assustadora, nos nos tornamos íntimos logo depois do primeiro encontro, no "L Cafe" em Williamsburg, Brooklyn.
Falávamos por telefone pelo menos uma vez por dia. Conversas longas, que iam desde a literatura até a política e nossos dramas diários. Seu livro mais conhecido (não se pode chamá-lo de romance, apesar de sê-lo: trata-se de uma autobiografia "em disfarce") é "O Berro do Cordeiro em Nova York".
Mas tem outros que não gostaria de listar ou comentar, pois estou em frangalhos e não sou crítico literário.
Passei a tarde com seu viúvo, Robert Eisenstat. Arquiteto, ele sobreviveu aos ataques ao World Trade Center, onde trabalhava. No terraço da casa, em Park Slope, Brooklyn, ele me contou de forma pausada como foram as últimas semanas da vida de Tereza. Acho que vale a pena falar um pouco sobre isso, porque é nesse processo que se pode enxergar melhor a autora, a poeta em toda a sua certeza de tudo, apesar de tão vulnerável e completamente fragilizada.
Radicada aqui havia 25 anos, Tereza Albues vivia em dois mundos distintos. Era uma autoproclamada solitária e, no entanto, distribuía alegria a todos, literalmente todos. Interessava-se por tudo, mas se desligava com a mesma rapidez. Difícil explicar. Escrevo no dia em que ela faleceu e estou inconformado com essa morte. Foi tudo muito rápido. Ela me dizia que o tratamento estava indo bem. Não estava. Hoje, o Robert me disse que a decisão de suspender tudo foi dela. Oh, Tereza! O que dizer de você? Você era um touro de pessoa lá do Mato Grosso, ou aqui de Nova York, sei lá. Fomos tão íntimos. E agora?
Vou deixá-los com o último texto que ela deixou guardado em seu computador (editado por questão de espaço), já que eu estou sem condições.
"Se pudesse fazer de conta, deixaria de lado a encomenda pesada de seus desejos. Cobranças. Lembranças. Coisas que tinha de varrer do espírito. Limpar a casa. Dia de faxina. Ares novos. Quero viver em paz. Novas perspectivas. Novas diretrizes e "goals" para a minha vida. Fazer mais para os outros (...).
(...) Obrigada, Senhor, pela oportunidade deste aprendizado. Sei que Deus vai me conceder esta graça."


Gerald Thomas é diretor de teatro

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