|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Crítica/jazz/"The Impulse Story"
Pode não agradar a todos, mas série Impulse tem valor histórico
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Numa época em que as
gravadoras reduzem
os lançamentos de jazz
a vocalistas conservadores,
uma série com músicos de vanguarda é uma ótima surpresa.
Ainda mais com gravações do
selo Impulse, responsável por
muito do que se produziu de
mais inventivo no gênero durante os anos 60 e 70.
A série "The Impulse Story" é
um desdobramento do livro
"The House that Trane Built"
("A casa que Trane construiu"),
recém-lançado nos Estados
Unidos. Nele, o jornalista Ashley Khan revive a história do
selo que se mistura com a ascensão do saxofonista John
Coltrane (1926-1967), ídolo
maior do jazz de vanguarda.
Criado pelo produtor Creed
Taylor, em 1960, o Impulse era
subordinado à poderosa gravadora ABC-Paramount. Mesmo
assim, tinha liberdade para
atuar como um selo independente, incentivando jazzistas
experimentais.
Figurões
Os dez CDs da série compilam as obras de figurões do
elenco do Impulse. As capas seguem o padrão gráfico que diferenciava os álbuns do selo nas
lojas: grandes fotos e lombadas
em preto e laranja. Responsável pela seleção das gravações,
Khan também escreveu saborosos perfis para os encartes.
Organizada em ordem cronológica, como todas da série, a
compilação dedicada a Coltrane sintetiza sua vertiginosa trajetória entre 1961 e 1967. Da
ainda comportada versão de
"Greensleeves" à angustiada
"Ogunde", passando pelos solos frenéticos de "Chasin" the
Trane", formou-se uma mística
ainda não superada entre os fãs
do jazz.
Três parceiros de Coltrane
nesse período também ganharam
compilações. O pianista McCoy Tyner,
que o acompanhou
até 1965, ainda soa
aquém dos limites
com a vanguarda
nos álbuns que gravou para a Impulse,
mas brilha quando
toca composições
próprias.
Depois de tocar
com o marido em
suas últimas gravações, Alice Coltrane
seguiu carreira solo.
Em faixas como
"Jaya, Jaya Rama" e
"Journey to Satchidananda", ela mostra um estilo
único ao piano, em meio a fortes influências orientais.
Pharoah Sanders, saxofonista que a acompanha em algumas faixas, enveredou por caminho
semelhante. Na hipnótica "The Creator
Has a Master Plan"
(com 32 minutos de
duração), ele combina caos sonoro
com referências espirituais.
Também adepto
do atonalismo do
free jazz, o saxofonista Albert Ayler
chamou a atenção
de Coltrane, que o
indicou à Impulse,
impressionado por
sua inusitada mistura de vanguarda,
blues e sons de bandas militares.
Já Archie Shepp, outro pupilo de Coltrane, foi o saxofonista
mais politizado dessa geração.
Sua composição "Attica Blues",
em protesto contra um massacre numa penitenciária, acabou
se tornando um clássico do jazz
militante.
Suíte inovadora
O baixista Charles Mingus e o
saxofonista Sonny Rollins já
eram consagrados, nos anos 60,
quando se uniram à Impulse.
Mingus criou ali um dos seus
melhores álbuns: "The Black
Saint and The Sinner Lady"
(1963), inovadora suíte, que
aparece na compilação. Rollins
também viveu um momento
especial, como provam as versões de "Three Little Words" e
"On Green Dolphin Street".
Já o pianista Keith Jarrett e o
saxofonista Gato Barbieri destacaram-se no elenco da Impulse dos anos 70. O grupo com
o qual Jarrett gravou faixas como "Bop Be" e "Silence" é cultuado hoje como uma das preciosidades daquela década. E o
argentino Barbieri (conhecido
pela trilha do filme "O Último
Tango em Paris") começava na
época a trocar a vanguarda por
uma síntese da música de vários países latino-americanos,
inclusive o Brasil, na percussiva
"Encontros".
Algumas gravações podem
até não agradar a todos fãs do
jazz, mas o valor histórico dessa
série é inegável. Que venham
outras.
(CC)
THE IMPULSE STORY
Artistas: John Coltrane, Archie Shepp e outros
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 25, em média, cada CD
Texto Anterior: Crítica/"The Sons of Cuba" e "The Legend of Cuban Percussion": Patato e Pio Leiva exibem diversidade da cena musical cubana Próximo Texto: Por que ouvir Índice
|