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Cinema/"Pergunte ao Pó"
Suavização de personagens prejudica história de Fante
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Robert Towne sonhava
filmar "Pergunte ao
Pó" desde os anos 70.
Pesquisava para escrever o roteiro de "Chinatown", de Roman Polanski, quando se apaixonou pelo romance de John
Fante, de forte caráter autobiográfico. Apesar do prestígio que
"Chinatown" lhe trouxe, Towne demorou mais de 30 anos
para levantar a produção. O resultado não escapou da sina
que assola projetos demorados:
uma enorme frustração.
"Pergunte ao Pó" passa-se no
mesmo local e época de "Chinatown": Los Angeles dos anos
30. Arturo Bandini é um alter
ego de Fante, descendente de
italianos que sai do Colorado
para tentar a vida na Califórnia,
sonhando transformar aventuras amorosas em bom texto.
Encontra realidade oposta: a
vida quase miserável da América da Grande Depressão, falta
de inspiração e paixões por mulheres longe do ideal romantizado, marginais como ele.
Towne abre o filme com um
espetacular plano-seqüência
que sintetiza a Los Angeles da
época. A câmera alcança Bandini enquanto ele pensa como
gastar sua última moeda de cinco centavos. Um cinzeiro com
cascas de laranja faz uma ligação com "Chinatown", que tinha a corrupção dos laranjais
californianos como tema.
É fácil identificar os problemas que minaram o projeto. O
tempo dedicado a ele não serviu para proteger o filme das
concessões impostas pelo fazer
cinematográfico, que implicam
a suavização dos personagens e
das situações em favor de uma
obra mais "abrangente" e uma
escalação de elenco que precisa
de um "nome conhecido" nos
créditos. Colin Farrell não é
Bandini nem na voz que narra a
história nem na atitude. A história perde suas qualidades como retrato ácido dos personagens. Rendendo-se ao "meio-termo" (tudo o que a literatura
de Fante não é), Towne fez um
filme fadado ao esquecimento.
PERGUNTE AO PÓ
Direção: Robert Evans
Elenco: Colin Farrell, Salma Hayek,
Donald Sutherland
Produção: EUA, 2006
Quando: hoje, no Espaço Unibanco,
Reserva Cultural, Bristol e circuito
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