São Paulo, Sexta-feira, 09 de Julho de 1999
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PELO MUNDO
A sóbria arte de Michel Bras

da Redação


Não é fácil conhecer o restaurante Michel Bras, na França, o único promovido à cotação máxima -três estrelas- na edição deste ano do guia Michelin, o mais respeitado do mundo.
Ele fica longe de Paris, quase uma hora de avião. Funciona no campo, na região da Auvergne, no pequeno hotel do mesmo dono. Que vive lotado, como os hotéis da cidade mais próxima, Laguiole, terra da "fouace" (enorme pão em forma de rosca) e das lânguidas facas curvilíneas -cuja fábrica principal foi desenhada por Philip Stark.
A solução: marcar hora no restaurante (um mês de antecedência); pegar um vôo matinal de Paris até Rodez; mais uma hora de táxi até o restaurante; e depois do almoço fazer o trajeto inverso para Paris.
Mas vale a pena conhecer a sóbria arte de Michel Bras. Seu hotel fica numa colina no meio do nada, com traços austeros e modernos de pedra e aço, lembrando uma nave espacial pousada placidamente entre as vacas da raça local (a Aubrac, mesmo nome da região).
A sombra do chef projeta-se em seus pratos -não em sua presença corporal, já que ele tem o perfil discreto de nunca desfilar pelo salão. Considerado o pai da "escola das ervas", sua cozinha é a da simplicidade e a dos legumes.
Feitos com ingredientes impecáveis, seus hits são pratos como o "gargaillou" de pequenos legumes cozidos, fresquíssimos, crocantes, aromatizados de ervas e flores. Ou o "steak" de tomate, o legume inteiro levemente assado, coberto por toques de manjericão, azeitona seca, alcaçuz... Ou ainda o linguado tenro, cozido à perfeição, servido sobre uma fina crosta de pão pincelada com alho-poró.
Se você pensa que não conhece Michel Bras, veja o menu de sobremesas: ali está, criação de 1981, a matriz abastardada das tortinhas quentes de chocolate com recheio líquido que esteve em voga em Nova York, e hoje é moda no Brasil. Mas Michel Bras não os faz com o recheio massudo e indigesto, cheio de farinha, como aqui: os dele, os originais, têm recheio de puro chocolate, envolvidos por uma fina camada de massa, a cada estação com diferentes sabores.
A perfeição? Não. Madame Bras e sua equipe podem dar informações erradas no salão (anunciar a trufa de verão como trufa branca; e anunciar o prato de carne como sendo uma peça de dianteiro, quando o que aparece no prato é um imperdoável medalhão de filé mignon -corte absolutamente dispensável num cardápio três estrelas).
Com vinhos bons, mas nada abusivos (meia garrafa de Jurançon, uma de Bordeaux Grand-Puy-Lacoste, duas taças de Champagne), a conta para dois saiu cerca de US$ 670. Preço correspondente à qualidade -e de qualquer forma, mais barato que a passagem de avião. (JM)


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