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COMENTÁRIO
Ana Carolina livrou mulher de jogo patriarcal
TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA
No "mar de rosas" do "Brasil Grande" dos anos 70, Felicidade (Norma Bengell), uma dona-de-casa que encarna, em toda
a sua opressão e desespero, a condição feminina na sociedade patriarcal brasileira, inaugura a obra
ficcional de Ana Carolina matando o marido. Gesto cujo simbolismo estará sempre no cerne dessa
obra que é uma das mais autorais
do cinema brasileiro.
Para nascer, o cinema da mulher brasileira teve que se livrar do
peso e da herança do passado patriarcal e dessas "imagens de si
mesmas" que os homens costumam criar para as suas mulheres
-"Não vendemos aos homens
até mesmo nossos desejos mais
profundos?", perguntava-se uma
das personagens de "Das Tripas
Coração".
Foi preciso apartar-se também
das "palavras de ordem": a originalidade dos primeiros filmes de
Ana Carolina reside sobretudo na
forma como subverte os hinos e
ditados patriarcais, colocando a
fala sempre em primeiro plano
para dar voz à mulher.
Da opressão de "Mar de Rosas"
(1977), realizado em pleno regime
militar, à histeria de "Das Tripas
Coração", realizado em plena redemocratização, em que todo discurso de autoridade masculina é
desmascarado por uma (segunda) conotação (sempre) sexual,
que corrói de licenciosidade a fachada do patriarcalismo nacional,
a obra da cineasta segue um processo de liberação e transbordamento da psique feminina que
culmina em "Sonho de Valsa".
Da dona-de-casa frustrada
("Mar de Rosas") à dondoca perdida ("Sonho de Valsa"), personagens de Ana Carolina, mulheres de todas as classes, nunca deixaram de encarnar, em suas crises, a própria realidade brasileira.
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