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"Artes do Conhecimento" reúne encontro de opiniões em 49 entrevistas publicadas no Mais!
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História imediata
OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quarenta e nove entrevistas publicadas no caderno Mais! sobre
ciência, filosofia, política e economia, antropologia e comportamento, e história são agora reunidas no livro "Artes do Conhecimento", segundo volume da série Memórias do Presente: 100 Entrevistas do Mais!".
O primeiro tomo, "Conhecimento das Artes" foi lançado em
maio deste ano e reuniu 51 entrevistas que abordavam cinema, literatura, crítica, artes plásticas, fotografia, teatro, música, dança, arquitetura e urbanismo com artistas e pensadores brasileiros e estrangeiros.
O que se encontra em "Artes do
Conhecimento" são análises a
quente que resistiram à queda da
temperatura jornalística provocada pela passagem do tempo.
A queda do Muro de Berlim e os
rumos da esquerda, a ditadura e a
democracia no Brasil, a atitude
politicamente correta e as políticas das minorias, o liberalismo
globalizante e o estatismo nacionalista, é extensa a lista de assuntos que são tratados em minúcia
nas entrevistas ao Mais!.
"Como foram feitas, em grande
parte, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, muitas
entrevistas abordam a relação entre o presidente e o intelectual",
diz o organizador do livro, Adriano Schwartz, editor do Mais!.
O trabalho está longe de se deter
em aspectos apenas conjunturais.
Como nota Schwartz no prefácio,
"a idéia de formação perpassa a
maior parte dos depoimentos".
Outra característica comum às
entrevistas é a de estarem mais
próximas da conversa ou da troca
de idéias (o que permite digressões), do que propriamente das
perguntas e respostas formais a
que estamos acostumados a ler na
imprensa.
A entrevista com o filósofo alemão Jurgen Habermas, que se estende por 30 páginas, é exemplo
típico de um bate-papo erudito.
Conduzida por Sergio Paulo
Rouanet e Barbara Freitag, a conversa oscila entre a camaradagem
e a sofisticação intelectual dos argumentos. Interessante é o debate
sobre multiculturalismo, em que
Habermas defende a possibilidade de coexistência de um sistema
jurídico de caráter individualista e
a "discriminação positiva", como
o sistema de cotas.
A conversa solta, por vezes, leva
a sínteses e definições a que o entrevistado, se estivesse escrevendo em vez de falando, não chegaria com igual espontaneidade. "A
filosofia não se resume a uma trama de argumentos; é igualmente
uma paixão", diz José Arthur
Giannotti, autor que, considerado
difícil ("ser filósofo ainda me parece consistir numa atividade de
desarrumação"), é mais compreensível na versão oral.
Com frequência, as entrevistas
são justapostas de modo a enfatizar a oposição entre pontos de
vista. Assim, a de Celso Furtado é
seguida da de Roberto Campos. O
desenvolvimentista Furtado argumenta que o papel do Estado se
esgotou só nos países mais ricos,
onde uma certa homogeneidade
social já foi alcançada. No Brasil,
ao contrário, não houve esgotamento, mas interrupção ("a grande quebra se dá quando pára o desenvolvimento, nos anos 80").
A entrevista de Campos tem um
registro mais ligeiro. O economista se permite compartilhar reminiscências ao falar da loira atriz
americana Kim Novak, que frequentou sua casa. "Minha mulher
é loira. A gente pode ser infiel a
uma mulher, porém não a um tipo de mulher", disse. Frasista de
talento, Campos também não é
infiel às idéias. Era tão liberal que
para ele até os liberais no Brasil
não passavam de falsos liberais.
"São liberais em política. Quando
você passa para o lado econômico, são intervencionistas."
A diversidade de opiniões, marca das entrevistas do Mais!, pressupõe o pluralismo democrático,
um dos assuntos do linguista
americano Noam Chomsky. O
pensador volta ao conceito aristotélico, por vezes esquecido, de que
"uma democracia deve assegurar
a prosperidade duradoura dos
pobres, por meio da distribuição
de verbas públicas". Como fica a
democracia hoje, no Brasil ou nos
Estados Unidos, julgada por esse
critério? Diz Chomsky: "Os mecanismos formais da democracia
existem, mas funcionam dentro
dos limites estreitos traçados pelo
poder privado".
A resposta revela um "pessimismo da razão", que Schwartz identifica como sendo o tom geral do
livro, mas com uma ressalva: no
fim das contas, o "otimismo da
vontade" é invencível.
Oscar Pilagallo é jornalista e autor do livro "A Aventura do Dinheiro"
ARTES DO CONHECIMENTO.
Organização: Adriano Schwartz. Editora:
Publifolha. Preço: R$ 59 (525 págs.)
CONHECIMENTO DAS ARTES.
Organização: Adriano Schwartz. Editora:
Publifolha. Preço: R$ 59 (560 págs.)
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