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MÚSICA
"Desafio o gosto das pessoas', diz Ben Harper
Divulgação
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O cantor e compositor Ben Harper, que toca no Free Jazz, em seu show no festival H.O.R.D.E., em Portland
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PATRICIA DECIA
enviada especial a Portland (EUA)
O guitarrista,
cantor e compositor californiano Ben Harper,
28, que se apresenta no Brasil
durante o Free
Jazz, faz música
tentando conciliar dois conceitos:
tradição e liberdade.
O primeiro está simbolizado na
sua guitarra Weissenborn, instrumento acústico, de colo, feito nos
anos 20. Com ela, Harper resgata
raízes da música negra norte-americana, do blues de Robert Johnson
ao hard rock de Jimi Hendrix.
Já a liberdade ele tenta conquistar fazendo discos diferentes entre
si, procurando não se filiar exclusivamente a um estilo, querendo dizer a seu público que não é possível
esperar uma continuidade.
"Desafiar o gosto musical das
pessoas permitiu que eu seja capaz
de fazer aquilo que quiser", afirmou em entrevista coletiva antes
de seu show em Portland, no Oregon, parte do festival itinerante
H.O.R.D.E. (leia texto ao lado).
Harper é o tipo de homem que
acredita no "sonho americano" e
que acha possível fazer música pop
sem se render incondicionalmente
à indústria do disco. Leia a seguir
os principais trechos da entrevista.
Pergunta - Como você se coloca
perante à tradição da música norte-americana?
Ben Harper - Gostaria de ser capaz de levar adiante a tradição da
música que me influenciou e ao
mesmo tempo estabelecer a minha
própria tradição individual. Quero
ser parte de uma herança musical,
ser um elo nessa corrente, acrescentando minha própria voz.
Pergunta - O que acha dessa nova geração de cantores soul, como
Maxwell e D'Angelo?
Harper - D'Angelo é ótimo, muitos são uma porcaria. Você poderia trocar os cantores e os ritmos e
ainda seriam as mesmas canções,
mas D'Angelo é fantástico.
Pergunta - Vê uma identificação
entre as suas letras e Bob Dylan,
quando canta contra a opressão?
Harper - Nem sei. Acho que expor a natureza dos sistemas sociais
que funcionam contra as pessoas,
trazer à luz o que fazem, é, em parte, mudá-los. É óbvio a quem eu
me refiro, e não preciso ser específico sobre um país, porque a opressão não o é. Está em todo o mundo.
Pergunta - E que tipo de resposta
você recebe de seus fãs?
Harper - Primeiro de tudo, eu faço música, não sou um político. As
pessoas respondem da maneira
como sentem a música. Desafiar o
gosto musical das pessoas permitiu que eu fosse capaz de fazer o
que quiser. Para o próximo disco,
percebi que tenho essa liberdade
musical, não preciso soar apenas
hard rock, ou folk, ou soul. Posso
estender os limites ainda mais ao
gravar.
Pergunta - Há fronteiras?
Harper - Acho que não, isso é interessante. Haveria fronteiras se
todos esperassem que eu lançasse
um disco de rock ou de reggae. Eu
estaria encurralado, então continuo misturando estilos diferentes.
Pergunta - Por que usa uma forma musical tão simples quando artistas estão usando tantos recursos
tecnológicos?
Harper - São definitivamente minhas raízes. Venho de um background de um certo tipo de som,
de uma certa ideologia. Eu gosto de
usar estilos mais antigos de gravação para atingir uma sonoridade
nova hoje. Porque todo o resto está
atrás do digital, então eu continuo
analógico. Os estilos mais antigos
de gravação tocam mais.
Pergunta - Você fez sucesso primeiro na Europa. Como acha que
os americanos vêem seu trabalho?
Harper - É, a Europa está sempre
à frente, mas o disco parece estar
indo bem aqui. Os EUA são um
mercado inteiro, muito grande e
difícil. O rádio e o vídeo são fragmentados. Dá muito trabalho, leva
mais tempo. A não ser que você esteja pronto a seguir um formato
amigável à imprensa, ao vídeo e a
se encaixar nesse modelo simples.
Eu tento não me envolver nisso.
Faço música porque tenho de fazer, porque isso é o que mantém
minha vida longe da tristeza, da infelicidade.
Pergunta - Há religiosidade na
sua música?
Harper - Não necessariamente.
Não me filio a nenhuma crença.
Acho que quando você é fanático
sobre uma crença, está se privando
de uma extraordinária quantidade
de conhecimentos que está em outros lugares. Tento não fazer isso.
Acredito em crenças diferentes, de
maneiras diferentes. Porque elas
falam para mim em partes diferentes da minha vida.
Pergunta - Você muda muito o
show? E continua compondo durante a turnê?
Harper - O show chegou a um lugar bastante confortável no último
mês, mas ele cresce. Desde que o
último disco saiu, venho compondo na estrada. Desde 94, na verdade, eu continuo na estrada. Vamos
voltar para o estúdio em janeiro.
Pergunta - Gosta de fazer turnê?
Harper - Adoro. Faço músicas para tocá-las ao vivo. Talvez em dez
anos eu não esteja dizendo isso. A
estrada não é um ambiente fácil
para ficar concentrado, saudável.
Mas, ao mesmo tempo, me preenche. Eu reclamo às vezes, mas é só
autopiedade. Se estivesse me aborrecendo, não estaria fazendo. Não
preciso do dinheiro tanto assim. E
não estou nem próximo do meu
melhor, tenho só 28 anos. Não
quero ter esse grande disco e a partir daí só decadência.
Pergunta - O que é esse "melhor"
que você quer atingir?
Harper - Apenas coisas pequenas
como paz mundial, a destruição de
todas as armas nucleares (risos).
Faço música, só quero escrever
grandes canções em estilos diferentes. Quero compor músicas que
sejam uma surpresa até para mim.
²
A jornalista
Patricia Decia viajou a convite do
Free Jazz/Souza Cruz
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