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Um espetáculo histórico
FERNANDO PEIXOTO
especial para a Folha
A montagem de "A Vida de Galileu", de Brecht, com o título de
"Galileu Galilei", foi um momento marcante para o Oficina.
Significou coerência e amadurecimento artístico e ideológico do
grupo, mas também acentuou
profundas divergências internas.
Por trás de tudo, uma questão essencial: José Celso Martinez Corrêa sentia o impulso de avançar na
linguagem cênica de "Roda Viva", enquanto Renato Borghi e eu
queríamos aprofundar a narrativa
criativa, sem o risco de assumirmos apenas uma postura anárquica e irracional.
Passamos a defender a necessidade histórica de incorporar
Brecht ao nosso repertório.
Insistimos em "Galileu" como
retomada de uma postura crítica
racional e consequente. Zé Celso
estava em dúvida, mas se decidiu
por "Galileu" quando o CCC
(Comando de Caça aos Comunistas) invadiu o Ruth Escobar e agrediu o elenco de "Roda Viva".
Agravam-se os problemas internos. Os jovens atores dividem o
elenco entre "marginália", eles, e
os que têm papéis principais, chamados de "representativos".
Mas a verdade é que tudo isso,
milagrosamente, não prejudicou a
força estética e política do espetáculo. O ensaio geral, assistido pela
censura, foi realizado na noite de
13 de dezembro de 1968, dia da
proclamação do AI-5.
Estávamos nos bastidores, alguns de nós, durante o espetáculo,
quando escutamos a notícia por
um pequeno rádio. Organizando
uma narrativa que mesclava o racional com o irracional, nosso
"Galileu" provocava uma reflexão intensa no público.
Hoje, 30 anos depois da estréia
do Oficina, não mais estamos envolvidos no cotidiano de repressão, mas "Galileu", cem anos
após o nascimento de Brecht,
mantém sua atualidade, seu vigor
poético e sua coerência política.
A peça situa o intelectual diante
da repressão, mas mergulha numa
análise reveladora e profunda do
significado do comportamento
ético e social do homem, os compromissos com a verdade e a moral, discute o problema do herói e
coloca em questão também o significado da traição.
Quando o discípulo do grande
cientista diz a ele que é infeliz o
país que não tem heróis, Galileu
responde: "Não! Infeliz o país que
tem necessidade de heróis!"
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