São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 2003

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CINEMA

"AMORES PARISIENSES"

Filme de Resnais confirma o lugar do cineasta no panteão dos monstros vivos do cinema

Seis personagens à procura de canções

Divulgação
Os atores Pierre Arditi e Sabine Azéma em cena do filme "Amores Parisienses", de Alain Resnais


CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR DO FOLHATEEN

Quem canta seus males espanta, já dizia o velho ditado. A partir dessa idéia banal, o veterano Alain Resnais, 80, só confirma seu lugar no panteão dos monstros vivos do cinema: aqueles que, a despeito da idade, guardam o poder de assombrar.
O autor de obras tão absolutas como "Hiroshima Meu Amor" e "O Ano Passado em Marienbad" compõe, em "Amores Parisienses", aquilo que na linguagem musical se chama "divertimento".
Para resumir, "Amores Parisienses" é uma ciranda, uma dança em que os pares se formam e se deformam no ritmo da música.
Portanto, não se engane com o título brasileiro infame. "Amores Parisienses" é um quase-musical. Não chega a ser um musical no sentido estrito porque não utiliza a dança como fator de encantamento. Mas chega bem perto de ser um musical, com toda aquela artificialidade associada ao gênero, no qual ao menor estímulo os personagens disparam a cantar.
O curioso aqui é como acontece a relação entre a situação e a canção. A idéia veio do dramaturgo britânico Dennis Potter (a quem o filme é dedicado), em cujas obras os personagens tinham o hábito de soltar a voz em conhecidas canções populares.
"Amores Parisienses" é essa brincadeira, ou melhor, "divertimento", mas não só. Depois de desmontar a memória ("Hiroshima Meu Amor") e as camadas do tempo ("O Ano Passado em Marienbad"), de ironizar os múltiplos níveis da psique ("Meu Tio da América") e de multiplicar ao infinito as variantes de um ato simples ("Smoking"/"No Smoking"), em "Amores Parisienses" Resnais refaz seu jogo com as noções de acaso e de coincidência. Os personagens se encontram por acaso, coincidências os aproximam. Só que essas leis da atração adquirem moto próprio e desencadeiam situações à beira do absurdo.
Nesses momentos, Resnais mostra-se a toda como aquilo que é: um cineasta do improvável. O que o aproxima de outro mestre, Luis Buñuel, que soube filmar como se tudo fosse provável. Ambos grandes monstros capazes de nos oferecer os mais extraordinários divertimentos.


Amores Parisienses
On Connaît la Chanson

    
Produção: França, 1997
Direção: Alain Resnais
Com: Pierre Arditi, Sabine Azéma e Agnés Jaoui
Quando: a partir de hoje nos cines Espaço Unibanco, Frei Caneca, Lumière e Pátio Higienópolis



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