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CINEMA/ESTRÉIAS
Diretor fez investigação sobre a indústria do setor para criar filme em que George Clooney vive um agente da CIA
"Syriana" levanta o tapete do negócio petrolífero
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Mesmo que "Syriana - A Indústria do Petróleo" fosse
um filme ruim -é excelente-, o
processo pelo qual seu diretor/roteirista passou para chegar à história que você vê na tela daria por
si só um filme -dos bons.
Stephen Gaghan foi alçado ao
primeiro time da cena cinematográfica pelas mãos de Steven Soderbergh, que o chamou para escrever o roteiro de "Traffic"
(2000), possivelmente "o" grande
filme hollywoodiano sobre o
mundo e o submundo das drogas,
que põe a nu a hipocrisia da guerra ao tráfico tal como ela é conduzida pelos Estados Unidos hoje.
Gaghan se baseou na minissérie
britânica "Traffik", é fato, mas o
que lhe dava conhecimento de
causa e profundidade tocantes era
o fato de ele próprio ser um ex-drogado, conforme revelaria depois, ao receber o Oscar de melhor roteiro adaptado em 2001.
Além da estatueta, a experiência
deu munição suficiente para que
o cineasta fizesse o que ele mais
queria: um filme isento e independente sobre o mundo e o submundo da indústria do petróleo e
a irresistível influência de seus interesses na geopolítica mundial.
Dito assim pode parecer um tema cacete, mas Gaghan fez o que
os bons contadores de história
conseguem fazer: pela via do thriller, deixou o assunto palatável
sem perder a profundidade, como
fez o brasileiro Fernando Meirelles em "O Jardineiro Fiel".
Assim, inspirado pelo livro "See
No Evil", do ex-agente da CIA Robert Baer, por quatro anos Gaghan saiu a campo. Literalmente.
O cineasta foi ouvir os protagonistas do mundo do petróleo, nos
Estados Unidos, na Europa, no
Oriente Médio.
Para conseguir os encontros
-como revelaria depois, em entrevistas na época do lançamento
do filme-, tinha Hollywood e
seus bastidores a seu favor; ao
mesmo tempo, não carregava a
pecha de ser da imprensa. "Ao saber que eu era do cinema, e não
um jornalista, contrabandistas de
armas me recebiam alegres e perguntavam detalhes sobre a vida
de Angelina Jolie", recordou.
Em certo momento, ele conseguiu marcar uma entrevista com
Sayyed Mohammed Hussein Fadlallah, líder espiritual do grupo
radical Hezbollah, no Líbano. Para tanto, se deixou ser "seqüestrado" por um carro no centro de
Beirute, vendado e levado a ele.
A cena, adaptada para o personagem de George Clooney, que
interpreta o tal agente da CIA,
acabou entrando em "Syriana",
que estréia hoje no Brasil. É um
dos grandes momentos de um filme cheio de grandes momentos.
Sua estrutura é similar à de
"Traffic". Gaghan desenvolve o
roteiro em quatro patamares de
um mesmo edifício: o aspecto financeiro, dos produtores e importadores; o legal, na figura dos
políticos e lobbystas de Washington; o ideológico, com a Casa
Branca de um lado e extremistas
do outro; e o subterrâneo, onde os
três se encontram e se misturam.
Todos, é a tese do filme, estão
interligados e se retroalimentam.
Uma seqüência-exemplo: representantes de produtores de petróleo do Texas conseguem que o
Congresso aprove uma medida
protecionista, o que obriga uma
refinaria a mandar seus operários
embora num país do Oriente Médio; desempregado, um deles é
atraído pelo canto doce de terroristas e vira um homem-bomba.
Imperdível para quem quer ouvir o noticiário internacional atual
e ligar lé com cré. Imperdível também para quem está atrás apenas
de um bom filme, que prenda o
interesse por mais de meia hora.
PS informativo: "Syriana" deu o
Globo de Ouro a Clooney; concorre a dois Oscars (ator coadjuvante e roteiro adaptado). E Gaghan já anunciou que dirigirá a
versão para as telas do best-seller
"Blink", de Malcolm Gladwell.
Syriana - A Indústria do Petróleo
Syriana
Produção: EUA, 2005
Direção: Stephen Gaghan
Com: George Clooney, Matt Damon,
Amanda Peet, Jeffrey Wright,
Chris Cooper, Tim Blake Nelson
Quando: a partir de hoje nos cines
Espaço Unibanco, Jardim Sul,
Pátio Higienópolis e circuito
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