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São Paulo, segunda-feira, 10 de março de 2003

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CINEMA

Com "O Homem sem Passado", Finlândia vira uma das favoritas na disputa entre produções estrangeiras do Oscar

Solidão fecha "trilogia da exclusão" de Kaurismäki

DA REDAÇÃO

Desempregados, sem-teto, solitários. Esta será a ordem dos temas da trilogia de Aki Kaurismäki iniciada em 1996 com "Nuvens Passageiras", que, em outubro daquele ano, levou o prêmio de público na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
"O Homem sem Passado" dá sequência a essa série com a tentativa de se reerguer de um homem de meia-idade (Markku Peltola) que perde a memória, os bens e a bagagem de toda uma vida. Ele será ajudado por uma integrante do Exército de Salvação -organização vinculada a causas humanitárias-, vivida por Kati Outinen (eleita melhor atriz no Festival de Cannes pelo papel).
Aos poucos, a personagem de Peltola vai emergir da declaração de óbito -após a internação em um hospital decorrente de um sério espancamento sem motivo- até a redescoberta do prazer de ouvir uma boa música, tomar uma cerveja com um amigo ou encontrar um novo amor.
Junto com seu passado, somem os problemas antigos, mas surgem novos: conseguir um emprego para se sustentar e dinheiro para subornar um guarda e convencê-lo a fazer vista grossa enquanto ele se abriga num pequeno contêiner à beira da costa, imitando a moradia de outros excluídos da riqueza finlandesa.
"Sem contar minhas adaptações de clássicos [como "Crime e Castigo" (83), "Hamlet Vai à Luta" (87) e "Juha" (98)" e os filmes que tratam da banda de rock finlandesa Leningrad Cowboys ["Os Cowboys de Leningrado Vão para a América" (90)", me concentro em descrever a Finlândia dos proletários e dos perdedores. Ricos, para mim, são chatos. Não há nada neles que dê enredo para um filme", conta o cineasta.
Mesmo fazendo parte dos longas-metragens que retratam a classe trabalhadora finlandesa, os membros do Leningrad Cowboys estão novamente presentes. "Não pude evitar. Nasci com ritmo no meu sangue", justifica.

Um pessimista
Assim, Kaurismäki, com um leve toque de Frank Capra, espalha aos nossos olhos pitadas de humor e críticas à política social da Finlândia. Ele discorda: "Capra era um otimista, coisa que nunca fui. Quis somente contar a história de alguém, enquadrada em algum lugar perto do gênero tragicômico".
O diretor usa todo o material rodado, nunca desperdiçando nenhum take. "Como sou eu mesmo que produzo meus filmes, aprendi a não filmar nada que não precise realmente. E quase sempre também faço a edição, portanto sei exatamente do que preciso", afirma ele, sobre seu estilo econômico.

Favoritismo
A indicação ao Oscar de "O Homem sem Passado" na categoria de filme estrangeiro elevou a Finlândia a um dos países favoritos -ao lado de "Hero" (Herói), do chinês Zhang Yimou- a levar a estatueta, numa premiação ainda inédita na história do país.
O melodrama mexicano "O Crime do Padre Amaro", de Carlos Carrera, corre por fora explorando o gosto da Academia hollywoodiana por tramas latinas, enquanto o alemão "Nowhere in Africa", de Caroline Link, e o obscuro holandês "Zus & Zo", de Paula van der Oest, configuram-se como os azarões da premiação dominical de 23 de março.
(LÚCIA VALENTIM RODRIGUES)



O HOMEM SEM PASSADO - Mies vailla Menneisyyttä. Finlândia/França/ Alemanha, 2001. Direção: Aki Kaurismäki. Com: Markku Peltola, Kati Outinen. Em cartaz nos cinemas de São Paulo e do Rio.


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