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ORQUESTRA SINFÔNICA MUNICIPAL
Falta muito, mas estão começando a pôr a casa da música em ordem
ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA
Já não era sem tempo. Finalmente começaram a mexer na
Orquestra Sinfônica Municipal,
que está de regente novo, programação nova, patronos novos, patrocinador novo e especialmente
de ânimo novo neste início de
temporada. Foi o que se viu segunda-feira no Teatro Municipal;
e se não é motivo, ainda, para euforia, já justifica, no mínimo, algum otimismo.
Ira Levin, o novo diretor musical da OSM, foi recebido como
um salvador, e oxalá tenha força
para tanto. Musicalmente, é um
disciplinador -o que talvez seja
um bom caminho para a salvação.
Sua principal virtude é a energia.
Outras, ele ainda não teve chance
de mostrar, até porque, por enquanto, a questão crucial é fazer o
mamute se levantar, romper a
crosta de gelo das costas e recuperar os movimentos, num fim de
verão que é um começo de fim do
inverno no Municipal.
Celebrai com júbilo, então, como diz o "Salmo 100", que a OSM
e o Coral Lírico interpretaram na
versão para sal, açúcar, azeite, pimenta, coentro e balsâmico do
compositor alemão Max Reger
(1873-1916). Tudo misturado
num rocambole contrapontístico
de grande fervor e grandes volumes. Justifica-se a escolha pelo
uso de forças máximas da orquestra, coro e órgão, e pelo que tem
de insólito. Se abatumou, não foi
culpa de ninguém. Vem assim de
fábrica.
A música ficou para a segunda
parte, com a "Nona" de Beethoven (1770-1827). Embora ninguém tenha ido ao teatro para escutar a "Nona", mas sim a OSM
com Levin tocando a "Nona".
Pontos altos: o novo instinto aeróbico da orquestra, a fluidez até
nas passagens mais difíceis, um
momento de eloquência nas violas no último movimento, os contrabaixos segurando a onda. O
Coro Lírico, que tende para os
grandes contornos mais do que
para as sutilezas, mas nunca faz
feio. E os solistas -Rosana Lamosa, Regina Elena Mesquita,
Fernando Portari e Lício Bruno-
fazendo música com segurança
num contexto nem sempre seguro, nem tão musical. Ponto alto
também para a elegância gracekelinesca de Lamosa.
Agora sejamos francos. A OSM
melhorou? Muito. Mas não é outra orquestra ainda. É a mesma,
tocando melhor. Se fosse uma orquestra estrangeira em visita à cidade, seria trucidada. E quem vai
reclamar de nós mesmos, senão
nós mesmos?
As cordas continuam irregulares, e não descobriram seu som; o
quarteto de trompas estava em
noite pouco feliz (habitual com
trompas, o que não serve de consolo), o naipe de sopros não chega
a ser um naipe, a entrada dos
trompetes no "Presto" foi criminosa e até o contrafagote não esteve sempre no centro das notas, o
que é de chamar a atenção naquelas profundezas.
E o "recitativo" das cordas, no
último movimento? Notas, notas,
notas. Som e fúria significando
nada. A orquestra teve momentos
bonitos, sem dúvida, sugerindo a
orquestra que poderia ser; mas
também teve momentos de banda. (Nenhum descrédito às bandas. Mas era a "Nona" de Beethoven.)
Já que estamos falando de tudo:
Schiller não é acessório; nem o
salmodista. A música só faz sentido -o seu sentido- quando entendida em relação com o texto.
Foi confiança demais na erudição
da platéia dispensar as palavras
do "Salmo" e da "Nona".
Por outro lado, limparam a rua
dos bandidos que praticavam o
arrastão do estacionamento.
ATENÇÃO: pode-se voltar ao
Teatro Municipal sem medo. E
sair sem medo, depois. Uma mudança e tanto para a vida cultural
da cidade.
Já não era sem tempo de alguém
mexer na OSM. Mas estamos bem
no começo. E sejamos mesmo
francos. Sem mudanças estruturais, dificilmente a orquestra pode
melhorar de verdade. Como diria
o patrono eterno de todos os secretários de cultura, Mário de Andrade, ninguém não teve ainda
coragem de pôr a casa em ordem.
A chegada de Ira Levin criou
uma circunstância nova e abriu
portas para se acabar com vícios
ancestrais não só da OSM, mas de
todos os quadros estáveis do Municipal.
Entrai pelas suas portas com
ação de graças, e logo.
Avaliação:
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