FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Brasília, 1º de janeiro de 2003, posse do presidente eleito Lula. Com caráter documental, o fotógrafo Mauro Restiffe apresenta, a partir de hoje, uma nova série de imagens denominada "Empossamento", na qual revela a transformação do Distrito Federal durante a data histórica.
Junto às imagens de Brasília, Restiffe exibe uma série sobre Istambul, na Turquia, um desvio ao olhar do mero registro da posse. O que há em comum em ambas? "Nas duas séries há uma religiosidade muito aparente. Na Índia, fica patente pelos alto-falantes que anunciam os horários das preces, pelas imagens dos carpetes nas mesquitas, com lugares marcados para rezar. Já em Brasília, ocorreu uma invasão popular levada pela figura carismática do Lula, como se o povo atendesse a um chamado", conta o fotógrafo, que acaba de retornar a São Paulo, após quatro anos radicado em Nova York.
Ele revela nessa série o caráter messiânico do presidente, tão fundamental em sua personalidade, sem, no entanto, apresentar uma foto onde Lula esteja visível. Fundamental é a relação entre massa e poder, dado marcante também na cultura muçulmana.
A peregrinação em busca do presidente, entretanto, traz marcas que vão além da questão religiosa: a ocupação de um espaço com características modernas, de ordenação racional, por uma massa orgânica e heterogênea, o que representa uma novidade em relação aos trabalhos antigos de Restiffe, mais marcados pela observação do espaço sem uma contaminação tão abrasiva, contraste, aliás, pouco visto em Brasília.
Esse caráter massivo, populista, ganha ainda um olhar nostálgico pelo tipo de registro, fotos em preto-e-branco, com grande granulação, que mais parecem imagens antigas. "Não é uma forma de crítica, afinal eu votei nele, mas há mesmo um questionamento aí, de um movimento popular que quase não existe mais. O que me interessa, de fato, é a contaminação das massas nesse espaço e como isso se dá a partir de uma figura", afirma o artista, que transformou o documental em plataforma de reflexão.