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ANÁLISE
Criador queria um grupo de "nível"
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
Nas palavras de Franco Zampari
(1898-1966), criador do Teatro
Brasileiro de Comédia:
"O TBC nasceu numa noite de
euforia na qual muitos brasileiros
sustentavam que só era possível
existir teatro na França, nos Estados Unidos, Inglaterra e Itália. Isso
quanto ao nível artístico, ao repertório e à interpretação. Eu, estrangeiro, porém casado com uma brasileira de 400 anos, me revoltei. E
apostei que montaria uma companhia em São Paulo, dentro dos melhores moldes".
Da união de um napolitano com
uma brasileira de 400 anos nasceria o TBC, "dentro dos melhores
moldes", um ano depois, em 1948.
A companhia se queria oposta ao
teatro comercial, de comediantes
como Procópio Ferreira.
Formou-se em parte com os
elencos amadores de Alfredo Mesquita (1907-1986) e Décio de Almeida Prado, ambos influenciados
pelas idéias do Cartel -como
eram chamados os diretores que,
na França de então, se insurgiram
contra o teatro comercial.
Entre os diretores franceses,
Louis Jouvet, que a Segunda Guerra manteve no Brasil no início dos
anos 40. Mas o Grupo de Teatro
Experimental (GTE), de Mesquita,
e o Grupo Universitário de Teatro
(GUT), de Almeida Prado, encontram raízes mais distantes.
Para Mesquita, elas remontam a
1916, quando "moços e moças da
sociedade paulistana" apresentaram um espetáculo folclórico de
Afonso Arinos, na Sociedade de
Cultura Artística.
Outros se seguiram, até o GTE e o
GUT, nos anos 40. E outros se seguiriam ao TBC, depois, em companhias como Teatro de Arena e
Teatro Oficina.
Essa é uma das versões para a origem e a continuidade histórica do
TBC -aquela versão que se estabeleceu, contada por alguns de
seus próprios personagens.
˛
Cacilda e Sérgio Cardoso
Outra versão vê o TBC como uma
sequência da experiência artística
e de profissionalização das companhias amadoras cariocas Os Comediantes e Teatro do Estudante
-anteriores ao GTE e ao GUT e de
muito maior êxito. Foi com Os Comediantes que Nelson Rodrigues
encenou "Vestido de Noiva". E foi
o Teatro do Estudante que montou
"Hamlet".
As grandes estrelas do TBC, Cacilda Becker (1921-69) e Sérgio
Cardoso (1925-72), saíram respectivamente de "Vestido de Noiva" e
"Hamlet", no Rio. De "Vestido de
Noiva" também saiu o diretor
Ziembinski (1908-78), levado ao
TBC no início dos anos 50.
Uma terceira versão histórica,
talvez a mais interessante por ser
menos explorada e por não se
guiar por bairrismo, mas por tradição cultural, especula sobre a continuidade, no TBC, das experiências teatrais da comunidade italiana de São Paulo.
Nos temas e personagens de Abílio Pereira de Almeida e Jorge Andrade, os autores brasileiros "oficiais" do TBC, em peças como
"Santa Marta Fabril" e "Os Ossos
do Barão", seria possível identificar o amadurecimento da comédia
de costumes dos anos 30, na São
Paulo ítalo-brasileira.
(Curiosamente, Abílio Pereira de
Almeida é irmão do maior dramaturgo desse teatro esquecido de
São Paulo, João Batista de Almeida, autor de "Filho de Sapateiro,
Sapateiro Deve Ser".)
˛
Diretores
Com suas influências diversas, o
que o TBC estabeleceu no teatro
brasileiro, em grande parte devido
a seus seis diretores italianos, três
deles saídos da Academia de Arte
Dramática de Roma (Adolfo Celi,
Flamínio Bollini e Luciano Salce),
foi o rigor técnico.
Um rigor que abrangeu a interpretação, a produção, cenografia,
iluminação. O poder no teatro saiu
das mãos dos chamados primeiros
atores, como os velhos comediantes Procópio Ferreira e Jaime Costa, e passou à mão dos diretores
-até então figuras praticamente
inexistentes no teatro nacional.
Novamente, porém, isso é o que
reza a história oficial. Na história
oral, que se ouve de quem presenciou os espetáculos, inclusive seus
críticos e historiadores, o que se
tem de certo é o fascínio que deixaram as interpretações.
Passagens como as de Cacilda
Becker como Kitty Duval, em
"Nick Bar", Marguerida Gauthier,
em "A Dama das Camélias", e Maria Stuart, em "Maria Stuart". Ou
de Tônia Carrero como Suzana,
em "Uma Certa Cabana", e como
Elvira, em "Uma Mulher do Outro
Mundo".
O "fenômeno" do TBC talvez se
revele mais, afinal, nas fotos de
Fredi Kleeman para Cacilda, Tônia
e os demais intérpretes do que nas
conclusões históricas.
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