São Paulo, sexta-feira, 11 de fevereiro de 2000


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BUÑUEL
Eurochannel exibe ciclo às quartas à noite

especial para a Folha

Uma das diversões ao ver o cinema de Luis Buñuel é tentar adivinhar o significado de determinados elementos incluídos por ele em seus filmes e exaustivamente -algumas vezes de forma mirabolante- interpretados pelos especialistas em sua obra.
Alguns dos filmes podem ser conferidos nas quartas à noite deste mês, no Eurochannel (TVA).
As obsessões de Buñuel se manifestam em pequenos detalhes, incluídos sutilmente ao longo de seus filmes. Tudo começa já em "O Cão Andaluz" (1929), a obra surrealista que escreveu a quatro mãos com Salvador Dalí.
Ali aparece simbolizada a figura do "Angelus", de Millet, inocente quadro com camponeses que Dalí, Buñuel e os demais surrealistas interpretavam como sendo representativa do louva-a-deus em pré-cópula: em seguida, a fêmea devorará o macho.
A própria imagem do olho sendo cortado teria sido inspirada em um retrato de Buñuel feito por Dalí. Pode-se reparar aí que a nuvem que aparece, ao fundo, pontuda, está exatamente na altura do olho direito do cineasta, como penetrando-o.
Uma cena recorrente em Buñuel é o da mulher cosendo ou bordando. Aparece em "Viridiana" (61), em "A Bela da Tarde" (67) -quando o marido já está na cadeira de rodas, Séverine (Catherine Deneuve) borda- e na cena final de "Esse Obscuro Objeto do Desejo" (77).
Inspirada no quadro "A Rendeira", do holandês Vermeer, outro alvo da interpretação "paranóico-crítica" dos surrealistas, a cena do bordado está associada à culpa na obra de Buñuel, não se sabe exatamente o por quê.
Há inúmeros outros detalhes oníricos: o homem carregando o saco que aparece ao fundo em "Esse Obscuro..."; o Jesus Cristo que ri de "A Via Láctea" (69); a cena da freira Viridiana despindo as meias -Buñuel era um fetichista confesso, embora se afirme um "pervertido" apenas "teórico" em suas memórias.
Toda essa gana de tentar explicar estas aparentes loucuras incomodava o cineasta. "A fúria de compreender é uma das desgraças de nossa natureza", escreveu, em "Meu Último Suspiro". Sobre a cena do saco, por exemplo, diz que a utilizou porque foi uma "inspiração repentina".
"Por quê? Impossível dizê-lo, a não ser que se caia nos clichês da psicanálise ou de qualquer outra explicação", disse Buñuel, que defendia: "Em algum lugar, entre o acaso e o mistério, insinua-se a imaginação, liberdade total do homem". (CYNARA MENEZES)



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