São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 2002

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ARTES PLÁSTICAS

Português expõe, em São Paulo, "Estrela Polar", com 14 obras, em referência às estações da via-crúcis

Mendes transforma galeria em capela

Divulgação
"Auto-Retrato de São Paulo", de Albuquerque Mendes, uma das 14 obras em "Estrela Polar"


DA REPORTAGEM LOCAL

O artista plástico português Albuquerque Mendes, com a instalação "Estrela Polar", transforma a galeria Brito Cimino, em SP, a partir de hoje, em uma verdadeira capela. Nas laterais do espaço, pinturas conduzem à parede frontal, uma espécie de altar, no qual o próprio artista se auto-retrata como crucificado.
"Os museus e galerias são hoje, afinal de contas, as novas catedrais. São esses os lugares, como as antigas igrejas, que nos possibilitam uma relação com o espiritual", afirma Mendes à Folha.
Desde os anos 70, o artista trabalha com rituais. Conhecido por suas performances -ele participou de vários festivais importantes do gênero nos anos 70 e 80-, essa forma de manifestação artística é para Mendes "um veículo para o transcendental".
"Estrela Polar" foi criada especialmente para a mostra de São Paulo, após o artista ter tido sua primeira retrospectiva encerrada, em janeiro último, no prestigiado Museu Serralves, no Porto, em Portugal, ainda sob a direção de Vicente Todolí, recentemente indicado para diretor da Tate Modern, em Londres. A nova exposição trata do encontro de duas culturas, brasileira e portuguesa, tema curiosamente inédito na obra de artistas plásticos lusitanos.
"O que me interessa é tratar do contato, do encontro de duas culturas", diz Mendes. Suas pinturas apresentam rostos pela metade, "a outra ainda está por vir", alguns de índios, outros de europeus. Sem pretender fazer uma crítica ao encontro ocorrido há 500 anos, Mendes sugere questões. "Será que batizar o índio foi uma forma de torná-lo feliz?"
A obra central da mostra é mesmo o auto-retrato do artista crucificado. No entanto, com o trabalho, Mendes não aponta para uma função martirizada do artista. "Não é essa a questão que me preocupa. Comecei a realizar os auto-retratos crucificados após um infarto, e dois deles foram produzidos para mostras no Brasil", conta o artista. Por isso a nova versão se chama "Auto-Retrato de São Paulo".
Nela, Mendes apresenta-se com aparência indígena. Pode não haver crítica explícita ao encontro ocorrido há 500 anos, mas sem dúvida há uma certa culpa.
As 14 obras, que serão vendidas individualmente, ganham na galeria características de instalação. Elas são ligadas por uma tênue pintura azul, que remete ao mar e sugere o nome da mostra. "Nós portugueses precisamos do mar; viemos para cá em pequenas cascas de noz, conduzidos pela estrela Polar, que foi o guia para o descobrimento", afirma Mendes.
Para Mendes, o descobrimento ocorreu em 86, data da primeira visita do artista ao Brasil. Desde então, tornou-se um dos portugueses mais especializados em artes plásticas brasileiras. "Sou do tempo em que na Europa as pessoas achavam que arte brasileira era apenas folclore", conta.
Colecionador de livros e catálogos do país, ele reúne atualmente mais de mil em sua casa, em Lisboa. "Comecei a comprar quando essas publicações eram pouco valorizadas, vasculhei sebos do Rio e São Paulo e tenho até o catálogo da mostra de Hélio Oiticica na galeria Whitechapel, de Londres, em 69", conta orgulhoso.
(FABIO CYPRIANO)


ESTRELA POLAR - mostra com 14 pinturas do artista português Albuquerque Mendes. Quando: abertura hoje, às 20h; de ter. a sáb., das 11h às 19h; até 28 de julho. Onde: galeria Brito Cimino (r. Gomes de Carvalho, 842, São Paulo, tel. 0/xx/11/3842-0634). Quanto: entrada franca; obras de R$ 10 mil a R$ 49 mil.



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