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Fotos propõem revanche da molecada
da Reportagem Local
O garoto de nariz sujo que perambula pelas ruas do país se converteu, já faz décadas, em presa fácil da mídia e da arte. Hoje, frequenta tanto o museu quanto o
"Fantástico".
Claro que uma dose considerável de boas intenções move lentes
e pincéis. Retratam-se os meninos
porque, afinal, estão em toda parte, reclamando a denúncia, exigindo o discurso inflamado, pesando
sobre nossas consciências.
Mas há sempre o risco da diluição: em vez de indignar, a oferta
excessiva de imagens acaba por
amortecer. Alguém já disse que
cor demais é cor nenhuma.
As polaroids de Luciana Napchan, embora se debrucem sobre
universo tão saturado, ainda conseguem surpreender. Ultimamente, quando fotógrafos apontam a
câmera para a "infância perdida",
o que se costuma ver são variações
em torno de três conceitos:
* A miséria dignifica suas vítimas. Meninos e meninas ganham,
assim, ares heróicos.
* A miséria não passa de miséria.
Daí tantas fotos de crianças cheirando cola, batendo carteira, brincando entre os ratos.
* A melhor testemunha da miséria é o miserável. Confia-se, então,
uma máquina fotográfica à molecada, que sai pelas redondezas documentando o próprio cotidiano.
Luciana faz diferente. Inspira-se
na publicidade e tira os meninos
do espaço onde vivem para colocá-los em lugar nenhum, diante de
um fundo azul.
Depois, propõe que gritem
-não de fome, dor, raiva ou medo. Que gritem, apenas. E, como
se trata de crianças, o grito frequentemente irrompe lúdico, entre risos, um grito de montanha-russa. O berro vira farra.
Eis o pulo-do-gato. Nos retratos
do MIS, cada garoto reconquista o
lugar que lhe pertence por direito,
mas que as privações materiais (e
os meios de comunicação e os artistas) insistem em lhe tirar: o da
infância pura e simples.
Os personagens das fotos deixam de ser moleques de rua, brasileiros carentes, meninos e meninas em situação social de risco.
São só crianças que se divertem.
E como, mais uma vez, se trata
de crianças, a diversão não tem
nada de ingênuo. O grito, maroto,
parece deboche. Carrega um quê
de revanche.
(AA)
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