São Paulo, segunda-feira, 12 de março de 2001

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CINEMA

Regina Jeha finaliza "Por Mares Nunca Dantes Navegados"

Cineasta faz expedição para filmar a história do Brasil antes de 1500

DA REPORTAGEM LOCAL

Dois continentes e um oceano atravessados em 54 horas contínuas de viagem. A pequena expedição que a cineasta Regina Jeha empreendeu até a Índia, no mês passado, foi coroada com a "impressionante" cena do rio Ganges tomado por milhões de pessoas, durante o Festival do Grande Cântaro, em Allahabad.
É da festa religiosa em que os hindus procuram lavar seus pecados que Regina extraiu as imagens de abertura do documentário "Por Mares Nunca Dantes Navegados", que finaliza nos próximos dias e que terá sua primeira exibição pública na mostra "O Estado das Coisas", no Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade (leia ao lado).
O objetivo de Regina na Índia, porém, era o exato avesso de desmanchar sinais passados. Ela queria respostas que a ajudassem a construir o "making of" do país.
Interessa à cineasta "contar a história do Brasil antes de 1500". Mais precisamente, desvendar o cenário que engendrou o império português e animou seus navegadores à aventura do mar com a intensidade que os levou até a Índia.
"Quero lançar luzes sobre nós e trabalho dentro da compreensão de que "o mundo é o meu quintal". Além do mais, nossa história sempre começou em 21 de abril de 1500. Acho indispensável entender o que houve antes e nos conduziu até esse ponto, de outra espécie de globalização."
Antes da Índia -onde entrevistou historiadores como o professor Pius Malekandathil e líderes religiosos como o brâmane Lúcio Miranda-, Regina fez escavação semelhante em Portugal.
Ouviu especialistas e encontrou opiniões cúmplices de algumas teses que defende no documentário: "Portugal tomou a frente nas expedições ultramarinas porque foi o primeiro Estado-Nação moderno. A primeira revolução burguesa ocorreu lá, em 1383. Portanto já havia capital comercial que justificasse as expedições."
Por que tamanho poderio se desfez em tão pouco tempo é outra questão que Regina tenta responder. "Por intolerância religiosa, pelo reacionarismo da aristocracia portuguesa, que expulsou os judeus do país. Eles foram para a Holanda e lá ergueram o país."
"Por Mares Nunca Dantes Navegados" terá 52 minutos, em suporte digital, porque foi concebido especificamente para exibição na TV. A narrativa do filme será entrecortada por passagens de "Os Lusíadas", de Camões, e por versos de Fernando Pessoa.
A cineasta diz que é um grande engano considerar o hercúleo poema camoniano um texto difícil para o leitor atual. "É atualíssimo, mas como Guimarães Rosa: precisa ser lido em voz alta para ser bem compreendido", diz.
Ao poeta que apregoava ter feito da língua sua pátria, Regina impõe suave rasteira, tomando-lhe de empréstimo as reflexões sobre Portugal e seus líderes. Haveria mais apropriado ancoradouro? (SILVANA ARANTES)


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