São Paulo, sábado, 12 de março de 2005

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ROMANCE/"UM DOMINGO PARA SEMPRE"

Cinema melhora obra de Japrisot

ANTONIO PRATA
ESPECIAL PARA A FOLHA

De início, os franceses acreditaram que a Primeira Guerra seria um passeio. Em poucos meses os alemães seriam postos para correr, e os soldados voltariam para casa. A metralhadora, inventada em 1884, complicou as coisas: o velho esquema de ir avançando sobre o território inimigo metro a metro, abrindo caminho a tiros e golpes de baioneta, caiu por terra literalmente: bastava um batalhão botar a cabeça para fora da trincheira que era ceifado pelas rajadas. Resultado: após um começo muito intenso, com sangue, suor e lágrimas dos dois lados, os Exércitos diminuíram o ritmo. O conflito foi longo, complicado e de pouca mobilidade.
O livro "Um Domingo para Sempre", de Sébastien Japrisot, se parece muito com a guerra que retrata. Começa com uma primeira frase de impacto -"era uma vez cinco soldados franceses que faziam a guerra porque as coisas são assim"- e um primeiro capítulo emocionante. Daí em diante, no entanto, até chegarmos às trincheiras inimigas -ou seja, ao desfecho-, atravessamos centenas de páginas de pouco conflito, entre escombros e balas perdidas das cenas iniciais.
A trama é interessante: cinco homens são condenados à morte por terem atirado em suas próprias mãos, tentando assim serem mandados de volta para casa. São jogados, de madrugada, no terreno entre as duas trincheiras inimigas. Se morreram de frio, foram alvejados pelos inimigos ou fugiram é o que tenta descobrir Mathilde, a pura, boazinha e incansável noiva de Manech, um dos condenados. Ao longo de 263 páginas ela moverá mundos e fundos para descobrir o paradeiro de seu amado. A busca, no entanto, é muito mais fruto de sua obstinação e de um amor incondicional -tudo leva a crer que ele está morto- do que de pistas que convençam o leitor a se envolver na trama, criando bom suspense.
A perda do ritmo policialesco poderia dar lugar à história de amor, a uma saborosa narrativa, ao aprofundamento dos personagens. Não é o que acontece. O autor abusa de recursos batidos e chavões. A tradução também não ajuda, formando frases quadradas e às vezes até sem sentido: "(...) as amizades que começam mal são as mais infectantes".
Sébastien Japrisot (1931-2003) era um pseudônimo, anagrama feito a partir de seu nome de batismo, Jean-Baptiste Rossi. Fez muito sucesso na França com livros policiais, ganhou prêmios e teve todos os seus romances adaptados para o cinema. Este livro, filmado por Jean-Pierre Jeunet, (com o título de "Eterno Amor", no Brasil) é um caso raro em que o filme é melhor que o livro. Mesmo assim, nem tanto...


Antonio Prata, escritor, é autor de "O Inferno Atrás da Pia" (2004, Objetiva), "Pernas da Tia Corália" (2003, Objetiva) e "Estive Pensando" (2003, Marco Zero)

Um Domingo para Sempre
  
Autor: Sébastien Japrisot
Tradução: Sieni Maria Campos
Editora: Relume Dumará
Quanto: R$ 39,90 (264 págs.)


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