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Texto preserva linguagem das ruas
DA REDAÇÃO
"O livro começa assim, ó", avisa
FF antes de começar a declamar
linhas com uma costura de rap:
"Nesse dia em que eu fui preso tive um pesadelo. Chovia. Venho
contando minha história desde o
início até o momento em que fui
preso: surpresa que o destino me
preparou. Eu venho, só na mente,
vivendo cada momento".
Apesar da maneira própria de
lidar com o texto, declamando
trechos de memória, de maneira
cantada, ele diz não formar suas
frases cantando. "Busco a rima, o
protesto. Com certeza o rap tem
influência, mas não canto, não. A
sonoridade está na cabeça."
A linguagem falada foi preservada em "Face a Face com o Crime". "Pode não estar muito correto, mas achei que precisava da
língua das ruas para não perder a
originalidade." FF estudou até a
sexta série e conta com uma rede
de amigos e de colaboradores para botar suas histórias no papel.
O livro foi construído pouco a
pouco em um caderno universitário, que passou pelas mãos dos
amigos e terminou com uma voluntária para a digitação. "Eu me
expresso bem, mas não boto pontuação nenhuma", diz FF, que diz
que só deu continuidade ao livro
após a aprovação de amigos.
Apesar de contar sua experiência no Carandiru em "Face a Face
com o Crime", o livro é estruturado em contos, sem cronologia linear, tendo como ponto em comum a presença de FF nas histórias contadas -como a do prisioneiro coreano que o perseguiu
implorando por analgésicos por
semanas até que FF percebesse
que a dor de cabeça crônica e o
eterno machucado na testa do detento eram frutos de sua maneira
de protestar contra períodos em
uma cela destinada a doentes
mentais: quebrando a louça da
privada com a cabeça.
FF não acredita que a onda de
filmes e livros sobre o Carandiru
possa desabonar seu livro. "Há
uma curiosidade mórbida sobre o
assunto. Quero mostrar que não é
história nem conto de fada. Eu estive lá e vivi aquilo."
"Face a Face com o Crime" é
também um apanhado de vozes
oriundas de experiências na prisão, sejam de presidiários, visitantes ou autoridades. Para isso, recolheu depoimentos: participam
do livro o vocalista do Racionais
MCs, Mano Brown, um dos autores do hit "Diário de um Detento"; uma amiga e ex-presidiária
conhecida como Bibita, para representar a voz feminina nos presídios; e o parceiro de rap no grupo Inciso 2 e sobrevivente ao massacre dos 111 no Carandiru que
usa o nome artístico de Jabu. Ainda espera declarações de Drauzio
Varella e Eduardo Suplicy.
Outro apêndice é um glossário
com gírias usadas pelos presos,
idéia a que Mano Brown se opõe.
"Ele diz que todo mundo vai ficar
sabendo das conversas dos manos, entendendo os códigos. Mas
as gírias mudam tão rápido que
não vai ter problema."
(MDV)
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