São Paulo, terça-feira, 12 de abril de 2005

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Texto preserva linguagem das ruas

DA REDAÇÃO

"O livro começa assim, ó", avisa FF antes de começar a declamar linhas com uma costura de rap: "Nesse dia em que eu fui preso tive um pesadelo. Chovia. Venho contando minha história desde o início até o momento em que fui preso: surpresa que o destino me preparou. Eu venho, só na mente, vivendo cada momento".
Apesar da maneira própria de lidar com o texto, declamando trechos de memória, de maneira cantada, ele diz não formar suas frases cantando. "Busco a rima, o protesto. Com certeza o rap tem influência, mas não canto, não. A sonoridade está na cabeça."
A linguagem falada foi preservada em "Face a Face com o Crime". "Pode não estar muito correto, mas achei que precisava da língua das ruas para não perder a originalidade." FF estudou até a sexta série e conta com uma rede de amigos e de colaboradores para botar suas histórias no papel.
O livro foi construído pouco a pouco em um caderno universitário, que passou pelas mãos dos amigos e terminou com uma voluntária para a digitação. "Eu me expresso bem, mas não boto pontuação nenhuma", diz FF, que diz que só deu continuidade ao livro após a aprovação de amigos.
Apesar de contar sua experiência no Carandiru em "Face a Face com o Crime", o livro é estruturado em contos, sem cronologia linear, tendo como ponto em comum a presença de FF nas histórias contadas -como a do prisioneiro coreano que o perseguiu implorando por analgésicos por semanas até que FF percebesse que a dor de cabeça crônica e o eterno machucado na testa do detento eram frutos de sua maneira de protestar contra períodos em uma cela destinada a doentes mentais: quebrando a louça da privada com a cabeça.
FF não acredita que a onda de filmes e livros sobre o Carandiru possa desabonar seu livro. "Há uma curiosidade mórbida sobre o assunto. Quero mostrar que não é história nem conto de fada. Eu estive lá e vivi aquilo."
"Face a Face com o Crime" é também um apanhado de vozes oriundas de experiências na prisão, sejam de presidiários, visitantes ou autoridades. Para isso, recolheu depoimentos: participam do livro o vocalista do Racionais MCs, Mano Brown, um dos autores do hit "Diário de um Detento"; uma amiga e ex-presidiária conhecida como Bibita, para representar a voz feminina nos presídios; e o parceiro de rap no grupo Inciso 2 e sobrevivente ao massacre dos 111 no Carandiru que usa o nome artístico de Jabu. Ainda espera declarações de Drauzio Varella e Eduardo Suplicy.
Outro apêndice é um glossário com gírias usadas pelos presos, idéia a que Mano Brown se opõe. "Ele diz que todo mundo vai ficar sabendo das conversas dos manos, entendendo os códigos. Mas as gírias mudam tão rápido que não vai ter problema." (MDV)


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