São Paulo, Segunda-feira, 12 de Abril de 1999
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Viva Compay Segundo e a 3ª idade!

JORGE MAUTNER
especial para a Folha

Antes do início do espetáculo já há um grande frenesi pelo ar. Grupos de pessoas fofocando e sorrindo e já tomados por uma atmosfera cubana. A casa está lotadíssima, cheia de pessoas em pé.
Quando entram Compay Segundo y Sus Muchachos, a casa quase vem abaixo de tantos aplausos. Acompanhado por guitarra, baixo, violão e percussão, o cantor e instrumentista Compay Segundo, com seus 91 anos e sua irradiante simpatia, conquista toda platéia presente tão logo entra em cena.
Sua voz, jeito de tocar e mímicas faciais atingem o máximo de malabarismo artístico de altíssima qualidade quando provoca as gargalhadas da platéia ao rebolar com movimentos sexuais seus quadris como se estivesse copulando no ar.
A eletricidade de uma alegria constante e permanente percorre o ar. A cantora Omara Portuondo entra e é aclamada. Quando Segundo se retira, há um breve intervalo e o programa prossegue com a entrada dos Afro-Cuban All Stars.
O naipe de metais começa a fazer ferver o ambiente. O trombonista Jésus Ramos Redonet faz seu solo e nele se percebem a sutilidade, a plasticidade e a percussão que nos é tão familiar, que vem dos candomblés e dos terreiros.
Em um dos cantos, como um pau de santo, Ramos Redonet canta -sim, porque também é cantor, como todos os outros músicos-, "turururimbim: mandinga!". Como se vê, a mandinga vem dos nossos terreiros e dos terreiros deles também.
O cantor e poeta Ibrahim Ferrer tem 63 anos. Ao cantar sozinho e depois em dueto com Omara, além do ritmo dos terreiros o palco está inundado por um estremecimento de alma romântico, porque ambos cantam canções do coração que falam de gardênias, açucenas e rosas.
Entre tantas estrelas quero destacar a presença dos percussionistas e também do grande pianista Rubén González, que nasceu em 1919 e que ao tocar seu piano eleva a nossa alma até Deus. Enquanto ele arranca uivos de beleza de seu piano, o cantor e poeta Ibrahim Ferrer, 63, em dueto com Omara, atiça a platéia a cantar com eles, terminando o espetáculo como em um mantra em que a cultura brasileira e a cubana se reconhecem como primas, talvez até irmãs.
Depois, é claro, voltam para o bis exigido por nova tempestade de aplausos. Por mim, eles poderiam bisar por toda a eternidade.


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Jorge Mautner é cantor, compositor e escritor.


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