São Paulo, domingo, 12 de junho de 2005

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CRÍTICA

"América" ganha erotização e audiência

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

"Sex Sells" (sexo vende) é uma das máximas da mídia. E é verdade: a novela-Titanic de Glória Perez que o diga. Claro que a troca de direção teve seu papel e não foi pequeno. Os acertos de ritmo, o esforço em clarear determinadas passagens, o foco maior em algumas subtramas; tudo isso minimiza, um pouco que seja, a confusão do roteiro e a circularidade dos diálogos. Mas, se a sexualidade dos personagens não tivesse aflorado com mais decisão -ainda que com bastante cafonice -, a novela não teria a recuperação de audiência que parece estar se consolidando.
Justiça seja feita a "América": não é a primeira e não será a última vez que as novelas recorrem ao aumento de temperatura sexual para levantar a audiência. E, de certa forma, apesar do formato às vezes apelativo ou vulgar, não é, em si, um mau sinal que as pessoas fiquem atraídas por cenas que sugiram sexo. Estamos falando aqui de adultos, evidentemente. (Em relação às crianças, a conversa deveria ser outra e o problema é que não é.)
Na verdade, sem um certo grau de erotismo, nenhuma narrativa do tipo telenovela se sustenta. O amor romântico evocado no melodrama inventa uma série de disfarces para o que é, no fundo, a história de uma paixão sexual. E aqui, no Brasil, a telenovela acompanhou e, de certa forma, ainda caminha em direção à liberalização dos costumes, notadamente na área do comportamento sexual e afetivo.
Apesar da inabilidade dramática de Deborah Secco e Murilo Benício, na novela, o sexo ainda tem alguma relação com uma idéia de erotismo. No pólo quase antípoda, mas não exatamente oposto, está a idéia que sustenta um programa como "Falando de Sexo com Sue Johanson". O programa é uma espécie de sucesso da TV paga e não é à toa. Sue, uma ex-enfermeira, provavelmente entrada na casa dos 70 (ela não revela), fala com uma desenvoltura espantosa sobre qualquer prática sexual excetuando-se aquelas que são mais ou menos unanimemente condenadas, como a pedofilia.
Se na novela ainda há espaço para alguma imaginação, aqui a coisa é tomada completamente pelo que há concreto na atividade sexual. Técnicas, saúde, doenças, artefatos, brinquedos, um tanto de moral, algum conselho sobre relacionamentos: o campo sexual fica reduzido a uma série de problemas e como resolvê-los.
Um dos aspectos que chama a atenção no programa é a "facilidade" com que Sue Johanson trata de temas, uhn, cabeludos e a naturalidade com que encara quase todo e qualquer tipo de comportamento sexual. Mas, num certo sentido, não poderia ser diferente: ela é herdeira de uma cultura que, em nome da tolerância, adotou um ponto de vista técnico que simplifica bem as coisas a uma equação em que o direito à privacidade, o consentimento entre adultos e alguns limites bem largos resolvem qualquer parada. Além de camisinha, claro.


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