São Paulo, sexta, 12 de junho de 1998

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MÚSICA
Artista carioca interrompe fase tecno para show roqueiro no Rio de Janeiro, que deve virar disco duplo ao vivo
Lulu Santos vai ao rock contra a corrente

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
enviado especial ao Rio

Lulu Santos, o porta-bandeira da introdução do tecno no pop brasileiro, resolveu nadar contra a corrente outra vez.
Montou um show de rock'n'roll básico, em formato guitarra, baixo e bateria, exibiu no teatro do Leblon, no Rio de Janeiro, gravou e pretende lançar em disco.
O show, que esteve em cartaz no Rio até semana passada e deve viajar a São Paulo após a Copa, baseia-se em "lados B" de Lulu -músicas que ele considera escaparem do padrão de hits fixados em 17 anos discográficos-, mais covers como "(Sitting On) The Dock of the Bay" (68), do soulman Otis Redding.
No palco, são só Lulu (voz e guitarra), Dunga (baixo e vocais) e Marcelo Costa (bateria). O trio se chamou Jakaré durante a temporada, mas já foi rebatizado Lulu Santos Trio -ou não.
"Jakaré foi um balão de ensaio. De resto, não tenho certeza absoluta ainda. O nome do show é "Trio'", contorna o artista, em entrevista por e-mail.
Mudança de rota
O anunciado disco resultante deve ser duplo, com um "lado B" dos "lados B", a ser gravado em estúdio.
"Tenho trabalhado com o título "Binário'. Seriam dois discos. Um ao vivo, com uma seleção do material do show. Outro, de estúdio, produzido por Liminha, com seis ou sete ou oito músicas", afirma o cantor.
Pouco antes de sua estréia, os planos eram outros: um show "normal" de Lulu seria gravado para um CD ao vivo -uma coisa hits mesmo. O que motivou a mudança de rota?
"Mandaram para minha ciência e aprovação uma fita de um especial de TV do último show que fiz em São Paulo, e detestei o que vi e ouvi", começa a explicar.
"Desde 1988 tenho feito, com uma ou outra variação sazonal, o mesmo espetáculo, em que se tempera o exercício do momento com os "standards' obrigatórios", intercepta a explicação.
"O que mais me incomodou na tal fita foi que, na mixagem do áudio, ouvia-se tudo -clave, saxofone, zabumba e o escambau-, menos guitarra elétrica. Isso não pode. Por outro lado, o cancioneiro em si estava sofrendo de tanta descaracterização", continua a explicação.
"Adoro tocar guitarra elétrica e o faço em quantidades industriais, ainda que ninguém esteja olhando/ouvindo. Me deu saudade de fazer isso em público, e, sobretudo, me deu vontade de exibir a parte do repertório que não esteve superexposta nestes últimos anos. Meu compasso deu uma guinada e o corpo foi junto", termina de explicar.
Tecno x rock
Nasceu, então, o "Trio". Em tempo em que vários dos brasileiros de sua geração -Lobão, Ira!, Barão Vermelho- se viram ao tecno, Lulu fala sobre dar as costas ao "ritmo do momento".
"Não faço ou deixo de fazer isso ou aquilo por causa de tendências, não as externas, pelo menos até estarem devidamente internadas. O não tecno desta situação dialoga totalmente com o tecno daquela. É informado por ela, poucas coisas são tão rock'n'roll como Chemical Brothers. Quis fazer um som mais pedaçudo, e fiz."
Mas a reviravolta para trás não seria caracterizável como "retrô"? "Essa medida do retrô, justamente, é a que dialoga com o contemporâneo. É a continuação daquela maluquice astrofísica que é meu hobby mental", ele dá a partida.
"A grande preocupação, a mais moderna da física contemporânea, é com a idade do universo, sua história e possíveis futuros. Tudo é uma questão de tempo, tempo para a frente, tempo para trás. O futuro já é/era. Futuro é quando todo(s) o(s) tempo(s) estará (ão) à sua disposição", ele conclui.
Entendeu? Pois é.



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